Por Clara Baccarin
Pretendo escrever um texto curto sobre esse assunto que para mim é tão vasto. Listar 10 coisas que tive que desaprender na vida é quase como escrever a biografia do meu descaminho, já que na maioria dos dias, eu levo minha vida justamente num remar contra a maré, num contestar padrões e num contradizer valores. Mas prometo ser sucinta desta vez, apontar essas 10 coisas escolhidas ao léu nessa terça-feira ensolarada, depois de tantos dias nublados e nessa casa cheia de janelas insinuantes e convidativas olhando pra mim enquanto escrevo e dizendo “vem logo pra vida!” Pretendo ser sucinta no texto porque hoje o dia é lá fora, e a introspecção ficará esperando a quarta-feira. A boa consequência é que você também poderá ler isso aqui rapidinho. Então vamos lá!
10 coisas que o mundo me ensinou e eu tive que desaprender:
Acho que quero dizer com isso que aprendi a analisar antes de concordar com o que já vem pronto, e analisar pode ser uma atividade profunda, tem muito a ver com se conhecer, com não se deixar levar por ideias de grupos, amigos, namorados, família. Tem a ver com um diálogo interno e um afastamento das situações, por mais que elas envolvam emoções e vontade de pertencer e compartilhar ideias que o tornariam uma pessoa legal aos olhos alheios. Ouvir, entender e falar consigo mesmo, eu realmente acredito nisso. Qual é o outro lado da moeda? Qual é a opinião contrária? Enfim, tudo, absolutamente tudo, é contestável, tem dois lados e deve ser refletido.
A fala excessiva anestesia os sentidos e outras formas de perceber o mundo. O mundo sempre me ensinou que quem fala, quem se comunica, quem tem o dom da palavra dita alta é poderoso, inteligente, conhecedor de coisas desse mundo. Pode ser mesmo, mas o silêncio, o aprender a escutar e sentir não só as pessoas, mas os olhares, os gestos, as estações, os sorrisos ou as faltas deles, te leva a conhecer coisas além desse mundo. Shh! Fiquemos um pouco quietos e escutemos os ecos dentro de nós que sempre são abafados pela fala excessiva. O silêncio tem tanto para nos dizer!
Escrevi assim esses dias “o meu lado mais bonito é a minha amizade com o meu lado mais feio”. Eu não quero eliminar o meu lado feio, mas quero entende-lo e deixa-lo ficar, porque acredito que o lado feio sempre fica de todo jeito e acredito que ser muito bom é só uma habilidade de esconder esse lado debaixo do tapete e não olhar pra ele. Mas ele mostra as caras cedo ou tarde. Acho que conhece-lo é também saber lidar com ele. Estou desaprendendo a ser linda e boa para ser inteira!
Li essa frase em algum lugar esses dias. E acho que é uma coisa que desaprendi, a não me preocupar tanto. Essa vida louca que nos faz pensar que devemos ser sérios, e termos sempre algo para nos preocupar. Claro que sempre há problemas: pessoais, sociais, políticos, culturais, ambientais… Evitar a preocupação exagerada não quer dizer fingir que os problemas não existem, mas é manter a calma para lidar com eles, é deixar de se preocupar sempre para poder usar o cérebro para algo mais prazeroso: imaginar! Lembrei agora de uma outra frase: “a imaginação é a inteligência se divertindo”. E eu acabo de criar mais uma frase agora: “a preocupação é a inteligência se poluindo”.
Como o mundo prega a importância de estar o tempo todo ligado, preocupado, ativo, útil, maquinal… Como o mundo é um joguinho em que os espertos vencem, te deixam para trás, te usam se preciso, ambicionam e alcançam a qualquer custo. E os bobos, os do mundo da lua, os que conseguem imaginar histórias e ver detalhes, os distraídos que dormem e ainda sonham, que acordam e ainda sonham, que proliferam sentimentos, que conservam a capacidade de sentir ao invés de entender, esses vivem! E os que entendem tanto tudo e todos, que não caem em armadilhas, também desaprendem a se entregar e a viver profundamente, porque ao entender demais o medo surge e domina tudo. Benditos os distraídos que ainda conseguem, mesmo que por um tempo limitado, naufragar na beleza das emoções e das pessoas.
O mundo fica ensinando a ir em busca de um tipo de conforto que me parece, às vezes, nos fazer viver como zumbis – cegos e sonâmbulos. Queremos ver a vida através dos nosso olhos preocupados e da vontade atenta de não fazermos papel de bobo, e o nosso gol se torna alcançar um pedacinho no mundo em que sejamos mais espertinhos, em que conheçamos todos os cantos, em que nos relacionemos sem grandes conflitos e que possamos seguir uma rotina sem grandes descobertas. Para mim isso parece, além é claro de uma monotonia, um viver em cima do muro, num equilíbrio estático, chato e pobre. Prefiro o inferno ou o polo norte, o morno me exaure e me mata lentamente.
Gosto muito dessa frase do escritor brasileiro Augusto Branco. Acho que a vida ensina a sermos rasos e insistentes, frios e comprometidos, focados e calculistas. Eu não. Sou profunda e não me demoro quando encontro campos inférteis, só fico se há amor, paixão, interesse… Há de haver um tempo dos amores crescerem e frutificarem? Sim, acredito nisso, tento cultivar amor, mas se ele não desponta, nem devagar, nem naturalmente, acredito na partida. Amor que é bom é orgânico, não precisa de tanta luta, nasce e cresce sozinho. Mas há pessoas que pavimentaram o próprio coração. E aí eu pergunto: para que desperdiçar sementes no asfalto? Desenvolvamos olhos para ver terras férteis! Maturidade é saber onde derramar a intensidade.
Pode até ser que seja, se for por uma causa, uma missão, uma paixão… Mas desacredito na ideia de que trabalho enobrece. Nem sempre, nem sempre. Muitas vezes, é bem o contrário disso. É triste ver que pagar as contas e construir uma aposentadoria, garantir um futuro confortável, seja o maior objetivo da vida das pessoas. Sei que pagar as contas é um mal necessário, mas não acho que esse deva ser o maior objetivo de todos.
Loucura, palavra tão ampla de significados. Pode ser uma extravagancia, um exagero, uma imprudência. Pode ser uma fuga, uma tentativa cega no desconhecido, um experimento, um contato com o novo, uma curiosidade que te faz querer ir além do sensato. A minha loucura é apenas uma incapacidade de pertencer a estereótipos. Loucuras sensatas me interessam.
Desaprendendo isso também, acredito apenas que: “Eu sou o que sonho”.
E agora eu vou para a vida lá fora! 😉
Arriverderci!
Nota da Conti outra: O texto acima foi publicado neste espaço com a autorização da autora.
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