Jocê Rodrigues

10 filmes Para Refletir Sobre a Complexidade das Relações

Todos nós passamos por momentos delicados em nossas relações. Seja pela falta de diálogo, pela insegurança que nos assalta hora sim hora não ou pela dificuldade de decifrar o que realmente se passa dentro da gente. Às vezes não estamos usando as ferramentas certas, os óculos certos, o microscópio ou telescópio certos e não conseguimos enxergar bem o que o outro quer ou mesmo o que nós queremos.

Ainda bem que existe a arte para nos ajudar nisso, para transmitirmos e para recebermos aquilo que não conseguimos dizer nem explicar. Seja literatura, pintura, teatro e por aí vai, a arte nos fornece equipamentos de ponta para a interpretação daquilo que já de mais profundo.

O cinema faz parte desse conjunto e o que apresento aqui é uma lista de filmes que colocam em xeque tudo o que acreditarmos saber sobre o relacionamento afetivo e amor romântico. Confira:

Cenas de Um Casamento (1974)

Lançado originalmente como uma minissérie para a TV sueca, o filme trabalha bem os aspectos da aparência social e externa do relacionamento – neste caso, do casamento entre Johan e Marianne. Ambos aparentam ser o exemplo de casal feliz, bem resolvido e bem sucedido, até que a visita de outro casal de amigos em crise expõe as rachaduras que Johan e Marianne fingiam não existir.

Este longa-metragem possui a densidade característica de Bergman e é um mergulho profundo nas águas do ressentimento e das intenções ocultas.

Amor Pleno (2012)

O diretor americano Terrence Malick pode ser considerado descendente direto de Andrei Tarkovsky. Quase sem diálogos e filmado inteiramente com luz natural, o filme segue a proposta de construir narrativas por fluxo de consciência, iniciado em “O Novo Mundo” e aprimorado em “A Árvore da Vida”. Intercalando imagens da natureza, que funciona como espécie de dramaturgia paralela, “Amor Pleno” ensaia um olhar demorado na relação de um homem do interior dos Estados Unidos que leva a namorada francesa e a filha dela para morarem com ele. A partir daí, acompanhamos os lapsos de afeto, decepção, solidão e questionamento existencial que cerca cada um de nós.

A todo momento, somos impelidos a questionar intimamente os aspectos que caracterizam o amor romântico. Além disso, há também na história um padre que passa a questionar outro tipo de amor, convidando-nos a assistir sua discussão particular com o divino.

Latitudes (2014)

 

Olívia e José são pessoas profissionalmente realizadas, viajando de uma parte para o outro do mundo, sempre a negócios. Depois de um primeiro encontro em Paris, eles passam a se encontrar sempre em um país diferente e aos poucos vamos conhecendo aspectos de suas vidas que voluntariamente omitem um do outro. O Filme foi lançado primeiro com uma websérie com oito capítulos, cada um com um destino diferente. Depois foi compilado e lançado em um único filme. Em cada um desses capítulos somos apresentados também à vida individual de cada um, decifrando melhor suas personalidades. O capítulo sete, de longe o melhor, é uma aula de roteiro que proporciona o momento mais significativo e catártico da trama.

Infiel (2000)

Um filme arrebatador! Com grandes doses autobiográficas do explosivo e genial diretor sueco Igmar Bergman– que deixou o roteiro aos cuidados de sua discípula Liv Ullmann, responsável pela direção do mesmo depois da morte de Ingmar. O filme retrata o trágico caso entre Marianne, uma atriz bem sucedida e com um ótimo casamento, e David, o melhor amigo do também bem sucedido maestro Markus, marido de Marianne (sim, Markus e Marianne se amam e sim, eles são felizes no casamento).

Expondo de maneira dolorosa e angustiante afetos como desejo e culpa, o longa é uma verdadeira lição sobre a natureza trágica do amor romântico e também sobre a insuficiência da nossa condição humana.

Transylvania (2007)

Este drama francês é sobre uma garota italiana que viaja com sua melhor amiga para a Transilvânia em busca daquele que ela acredita ser o amor da sua vida. Acompanhamos sua jornada e somos presenteados com imagens estonteantes de festas e lugares culturalmente ricos. Apesar de algumas surpresas ruins, a moça acaba por descobrir que pode estar no lugar certo e na hora certa. Afinal, o acaso também faz parte das relações.

Hiroshima, Meu Amor (1959)

Atingindo o limite entre literatura e cinema, o filme precursor do movimento Nouvelle Vague conta a história de um caso amoroso entre uma atriz francesa e um arquiteto japonês em plena Hiroshima dos anos 50. Primeiro filme a usar cenas de flashbacks, a produção é também uma profunda reflexão sobre o tempo e sobre a memória.

Dois grandes riscos aos assistir o “Hiroshima, Meu amor”: amar Nevers incondicionalmente e, se você for escritor ou roteirista, ser contaminado por um longo tempo pelo conjunto de relações formais do filme dirigido por Alain Resnais e com roteiro da escritora Marguerite Duras,  que mais tarde viria a ser laureada com o Prêmio Goncourt.

Closer (2004)

“Closer” mostra a instabilidade emocional de quatro personagens. É um tapa na cara em muitos momentos, pois evidencia muitas das neuras, inseguranças e questionamentos que nós temos e que não somos capazes de expor ou admitir em nossos próprios relacionamentos. Muitos dos nossos próprios medos e desejos são eviscerados fria e calculadamente neste ótimo drama.

Annie Hall (1977)

Embora tenha sofrido com uma tradução quase dantesca de tão ruim (o título foi traduzido e lançado no Brasil como “Noivo Neurótico, Noiva Nervosa”), este talvez seja o retrato mais divertido e ainda assim sincero de uma relação amorosa de que se tem notícias. O curioso é que Woody Allen nunca quis fazer humor com o filme. Nele, acompanhamos o comediante neurótico Alvy, que começa a refletir sobre sua vida depois de terminar com Annie, ao mesmo tempo em que se envolve com uma garota muito mais jovem que ele.

Separações (2002)

A comédia romântica de Domingos de Oliveira é outro exemplo de profundidade e bom humor. Cabral e Glorinha (nomes pra lá de rodrigueanos) resolvem dar um tempo do casamento, mas Cabral não cabe em si de revolta e ciúmes quando descobre que Glorinha se apaixonou por outra pessoa. Arrependido, ele faz de tudo para ter a esposa de volta e envolve em sua trama uma gama de outros personagens curiosos e interessantes. A questão aqui é: é realmente melhor se arrepender de ter feito algo do que de não ter feito?

Ela (2013)

Sei que é lugar comum colocar este filme em listas deste tipo, mas creio ser necessário assim mesmo. É que não são todas as pessoas que conseguem captar a imensa solidão que permeia toda obra. Não é apenas sobre um homem que se apaixona e se relaciona por seu sistema operacional, é também sobre como estamos cada vez mais solitários no meio da multidão, sobre o desespero que silenciosamente toma conta de nós. Mesmo a tecnologia – com a qual nos relacionamos constantemente ou da qual fazemos uso para nos relacionarmos com outra pessoa que pode estar a quilômetros ou a metros de distância – pode agravar o isolamento antes de nos abandonar. Antes temíamos a solidão, hoje temos medo de companhias reais.

Jocê Rodrigues

Editor, escritor e jornalista.

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