Sob o Signo do Sal
O mar encanta, fascina e amedronta os homens há muitas e muitas gerações. Ainda é o principal provedor de alimento para muitos povos; para outros, rota indispensável de tráfego. Para além dessas funções puramente práticas, também atrai os que buscam aventuras e uma parcela destes acaba, ano após ano, perecendo em suas vagas.
São diversas as interpretações, inesgotáveis aproximações conceituais com as quais vestimos as águas e as ondas. Somos animais simbólicos, já escreveu Ernst Cassirer (1874-1945), procuramos dar sentido a tudo que nos cerca. Assim como o céu, o mar nos faz sentir a pequenez da humanidade, a fragilidade da vida, a limitação de nosso conhecimento. Somos frágeis e perecíveis, é o que ele parece nos dizer sempre que avançamos por ele, seja na superfície ou nas profundezas.
Os relatos e divagações sobre sua grandeza e imponência são muitos. Eles nos encantam porque nos apresentam àquilo que poucos têm coragem de enfrentar. Pedras, chuva, tempestades, ribombares assombrosos e o sentimento de estar na presença da morte, do fim de tudo que um dia conhecemos.
Apresento a vocês uma lista com 10 livros onde o mar aparece como principal elemento. A lista inclui apenas livros de ficção; os de não ficção terão uma lista exclusiva em breve.
Único romance de Edgar Allan Poe (1809-1849), originalmente publicado em 1838. Assim como Moby Dick, a história se passa na cidade baleeira de Nantucket. Vale lembrar que o célebre livro de Herman Melville seria lançado apenas 20 anos mais tarde. Poe mais uma vez se mostra um verdadeiro mestre em abordar o psicológico do leitor. A diferença é que, destoando um pouco de seus outros trabalhos, não é o terror ou o grotesco que ele usa para isso, e sim o aspecto de aparente realidade que permeia o romance. Isso fez com que muitos o tomassem como um relato verídico e apontassem erros geográficos no livro.
Seja como for, é uma obra que merece mais atenção. Não só por ter saído da mente do “mestre do horror”, mas pela história envolvente e bem construída, digna de um dos maiores escritores modernos.
A edição da extinta Cosac Naify é luxuosa e conta com introdução de Fiódor Dostoiévski e apêndice com sugestões de leitura assinada por Baudelaire. Para quem não é tão exigente, a L&PM Editores colocou no mercado uma edição de bolso, com tradução de Arthur Nestrovski.
Um dos livros mais belos da literatura ocidental. Nele, toda a força poética do escritor francês Victor Hugo (1802-1885) se manifesta de maneira ímpar enquanto narra as desventuras de Gilliatt, personagem cativante que luta não só contra fatores sociais, mas com a natureza. Todo o enredo se passa em uma comunidade numa pequena ilha, na qual muitos de seus habitantes vivem do mar. A revolução industrial também é tema, junto a uma tortuosa e improvável história de amor com diversas reviravoltas. Tocante, profundamente tocante.
A primeira edição brasileira teve tradução de ninguém menos que Machado de Assis. Se bobear, dá para encontrar ainda em algum sebo essa tradução, em edição muito bem acabada da editora Abril.
O norueguês Carsten Jensen (64 anos) narra de maneira exuberante e grandiosa o surgimento da moderna Dinamarca através de várias gerações de navegadores da pequena cidade de Martsal, em viagens por várias partes do mundo. Os acontecimentos do livro cobrem o período que vai de 1848 a 1945, dividido em quatro partes. Uma curiosidade é que o livro é todo narrado por um “nós”, o que torna tudo mais interessante do ponto de vista interpretativo. Um livro sobre o tempo, legado, vida, morte e, claro, sobre o mar.
Difícil escolher apenas um livro de Joseph Conrad (1857-1924) para essa lista, já que muitos de seus romances tinham o mar como tema ou pano de fundo. O próprio autor foi capitão da marinha mercante inglesa. Em Juventude, quatro homens em uma taberna prestam atenção no relato de Marlow sobre sua juventude passada no mar. A narrativa é direta e intensa, o bastante para nos fazer embarcar nos vertiginosos acontecimentos que cercaram um inexperiente marinheiro em direção ao Oriente.
Ernest Hemingway (1899-1961) ainda hoje inspira jovens e experientes escritores ao redor do mundo. O vigor e a clareza da sua escrita e também o modo de vida viril continuam a ser amplamente admirados. Foi com O Velho e o Mar que Hemingway ganhou o Pulitzer em, 1953. De certo modo, os embates de Santiago, protagonista do livro, são os mesmos que todo o homem enfrenta no decorrer da vida. A espera, a perseverança, o orgulho e o respeito. Somos todos partes deste pescador cubano que destemidamente encarou os perigos do oceano. Suas tristezas e alegrias frente as dificuldade são também as nossas. Em se pequeno livro, o autor americano conseguiu pintar um dos quadro mais fortes da natureza humana.
Em 2011, depois de mais de 68 anos, o primeiro romance do expoente beat Jack Kerouac (1922-1969) veio à luz.
“O Mar é Meu Irmão” traz alguns temas que tornariam Kerouac conhecido, como as viagens, as brigas e as bebedeiras. O livro curto, de fácil leitura e cheio de movimento. O mar aparece pouco, mas o suficiente para marcar o leitor.
O romance de Jack London (1876-1916) foi originalmente publicado em 1904 e foi de cara um sucesso. O livro traz resquícios de acontecimentos que marcaram a vida de London, como o dia em que quase perdeu a vida ao cair na água após uma bebedeira. Outro momento que o influenciou foi quando se tornou tripulante de um navio para caçar focas no pacífico. Os personagens cativam pela profundidade com que são expostos, não de forma descritiva, mas sob a óptica de funcionalidade dentro da Ghost, a escuna que os transporta. Os diálogos são, sem dúvida, o ponto alto do livro. Bem construídos e cheios de referências e insights.
Essencial para todo aquele que se interessa pela vida no mar, o clássico de Herman Melville (1819-1891) traz descrições detalhadas sobre como costumava ser a rotina de um baleeiro. Repleto de referências náuticas, ensina medidas, processos e termos que guiavam a vida dos homens em alto mar. Melville também trabalhou como marinheiro em navios mercantes e baleeiros, o que o tornou um profundo conhecedor do cotidiano e da mentalidade de quem depende do mar para viver.
No livro do irlandês John Banville (70 anos), o mar desempenha o papel não apenas de caminho que liga um destino a outro, mas também de metáfora. A narrativa chega a ser demasiada densa em alguns momentos, como nevoeiro a cobrir as vagas da memória que o protagonista, um historiador de arte que tenta lidar com a recente morte da esposa, detalha melancolicamente. O romance nos leva em uma busca pelo passado através de memórias constantemente costuradas. Passado e presente se fundem, formando um sofisticado quebra-cabeça que se resolve de maneira impressionante no final.
É difícil imaginar que Jorge Amado (1912-2001) tenha escrito esse livro aos 24 anos. A vida dos pescadores do cais de Salvador é contada com lirismo, uma vida calma e desatenta aos perigos e problemas exteriores. É preciso que dois forasteiros “ilustrados” tentem alertar o povo marinheiro do estado de opressão social em que vivem. Os orixás são homenageados, assim como a malandragem, o jogo de cintura, os amores e desamores do povo do mar.
O livro foi adaptado para a televisão por Aguinaldo Silva na novela “Porto dos Milagres”.
Imagem de capa: First For Home, de Thomas Hoyne.
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