Eu amo tanto minha mulher que temo dizer que estou feliz quando estou sem ela. Até porque não sou inteiro mesmo. Não considero justo. Não condiz com à realidade.
No momento em que ficamos distantes, por viagem ou motivos profissionais, não esnobo, não me gabo, não exagero a felicidade. A saudade não deixa.
Respondi que o passeio foi dentro das expectativas, o restaurante foi gostoso, a noite com os amigos foi agradável. Nada demais. Não faço propaganda da minha eventual saída, não existe nostalgia da autonomia de solteiro, muito menos a necessidade de gerar ciúme e criar comparações. A discrição é demonstrar cuidado com o nosso par.
Não omito, realmente não me sinto confortável em ser melhor quando ela não está junto. E não sou. Sou um quase bem simpático.
É uma questão de respeito romântico. Elogiar excessivamente o desapego equivale a subestimar sua presença tão marcante ou subentender que ela não é necessária.
É uma questão de respeito romântico. Elogiar excessivamente o desapego equivale a subestimar sua presença tão marcante ou subentender que ela não é necessária.
Não me envergonho da dependência, posso ser classificado como alguém sem liberdade e submisso. Alguém sem vida própria. Não acho que é isso. Talvez seja antiquado, herdei valores familiares e uma etiqueta de relação que não abdico. Privacidade corresponde a proteger quem amamos de nosso orgulho e soberba. Escolhi viver com ela e, apesar de afastado por alguns dias, continuo vivendo com ela. Longe ou perto, não mudo em nada da minha mentalidade casada.
Qual a graça de contar vantagem? Nenhuma. É mais uma implicância do que uma verdade.
Há sempre uma ponta de melancolia em minhas andanças sozinho, uma brisa fria a sussurrar em meus ouvidos o quanto ela gostaria daquele espaço.
Eu me torno um olheiro sentimental de nosso casamento, conheço paisagens e locais só para depois mostrar para ela. Minha função é recrutar alegria para nós – e descobrir o que provocará seu arrebatamento. Transformo a visita solitária em convite a dois: “Passei por um lugar que vai adorar, pensei na gente”.
E o mais bonito é que ela faz o mesmo, sem jamais combinarmos a troca de gentilezas.
Fabrício Carpinejar
Publicado originalmente na Revista IstoÉ Gente