O photoshop surgiu em 1990, e foi desenvolvido pelo engenheiro de software Thomas Knoll e seu irmão, John. Foi criado, originalmente, para ser usado como software para gerar e manipular imagens digitalizadas por scanner, a ser utilizadas em efeitos visuais para filmes, permitindo retoques e alterações de cor, contribuindo, assim, para o aumento da mágica do cinema. Esse programa também permite restaurar fotos antigas, além de manipular e salvar imagens em vários formatos. Como (quase) tudo na história da humanidade, a pesquisa evoluiu, as possibilidades se ampliaram e o photoshop ganhou outras funções menos nobres, que nos fazer sonhar através dos filmes. Ele é cada vez mais usado para afinar silhuetas, eliminar imperfeições, enfim produzir corpos e rostos modificados a partir de um original, uma base com possibilidades de apresentar uma beleza, antes original, mais próxima de padrões a serem multiplicados.
Na internet, é fácil encontrar matérias sobre os exageros no uso do photoshop, que seriam cômicas se não fossem a prova de uma cultura da estética que, desculpem o trocadilho, perdeu a mão e o senso de realidade. Membros, como braços e pernas, que somem ou são torcidos em ângulos estranhos; pernas que aparentam ser de pessoas diferentes, de tão impossivemente desiguais; umbigos que desaparecem misteriosamente, tornando a modelo representante de uma raça alienígena; pescoços inexplicavelmente alongados ou encurtados; pés em posições inverossímeis e mãos que parecem pertencer a bonecas; cinturas tão finas que não podem fazer parte do torso que as acompanha, estes são os exemplos mais bizarros (ou assustadores, dependendo da foto) de mau uso da ferramenta.
Mas, os piores casos são os mais banais, passando despercebidos a um olhar menos atento, que se limita a passear pelas capas de revistas expostas nas bancas e livrarias. Trata-se da eliminação total de rugas, imperfeições ou outras marcas, como de acne, criando, assim, um rosto impossível de ser exibido até para uma linda mulher (sim, refiro-me à famosa foto de Julia Roberts na campanha publicitária da Lancôme). Quando, além da modificação de medidas, com um emagrecimento de modelos e atrizes que nem precisam dessa redução, ou com o acréscimo de músculos, principalmente em rapazes, as marcas do tempo se tornam alvo do photoshop, passamos da busca por um ideal de beleza para um nível ainda mais difícil de ser alcançado: o fim do envelhecimento.
Maturidade, terceira idade, melhor idade, as expressões mudam, mas o quanto a real percepção, ou, mais ainda, aceitação, desse processo inevitável realmente mudou? Teria o medo da velhice sido superado? A dificuldade de lidar com a passagem do tempo estaria acompanhando os ganhos na qualidade de vida de quem passou dos, digamos, cinquenta anos? Ao mesmo tempo que se usufrui dos avanços da ciência, que a qualidade de vida se beneficia do auxilio da tecnologia, que proporciona facilidades nas tarefas diárias, que a indústria da beleza oferece tantos produtos, para todos os bolsos e gostos, que prometem milagres, os indivíduos ainda parecem insatisfeitos com seus atributos físicos, invejando a beleza sobrehumana, porque artificial, do artista do momento.
Cirurgias plásticas no carnê, cremes e loções, receitas caseiras (a mais conhecida é a do dr. Pitanguy), fórmulas inócuas, dietas infalíveis, e a lista não para de aumentar, há opções para todos os graus de credulidade. Porque, como diz o poeta, o tempo não para. E se for perguntado a um cientista, ele dirá que para um corpo diferente do próprio biotipo, só com o photshop. A felicidade está além do espelho: ela reside no olhar de quem está em paz com as imperfeições e elege outros atributos, menos palpáveis, mas nem por isso, pouco visíveis, e que todos, independentemente das características físicas, podem cultivar em si mesmos. Talvez o photoshop interesse aos que se dedicam a transformar rostos e corpos, como se fossem aquela massa de modelar com que as crianças brincam. Afinal, o consumo não perde tempo com o intangível.