Reunião da Tupperware

Lembro-me da cena como se fosse hoje: eu, às gargalhadas, debochando do programa para o qual minha mãe fora convidada. Também, pudera! Reunião da Tupperware não era lá a coisa mais divertida a se fazer. Fiquei imaginando o tamanho do desperdício, já que aquilo duraria a tarde inteirinha do sábado.

E não seria um único evento. Era feito uma vez por mês.
Tal ritual consistia em agrupar o maior número de mulheres possível na casa de alguém para que a vendedora viesse apresentar um sem número de potes, bacias, garrafas e outros utensílios plásticos. A mesma vendedora faria uma receita para degustação e demonstração da utilidade de alguns itens.

Ao final do evento, as convidadas poderiam comprar e encomendar o que quisessem. A anfitriã (que oferecia seu espaço para o evento) ganharia um mimo de acordo com o valor das vendas, mas (e é aí que mora o perigo), três de suas amigas deveriam ceder suas casas para as próximas reuniões. Só assim o mimo seria, de fato, dela.

Lembro-me da cena como se fosse hoje: eu, rindo de mim mesma, recebendo de uma amiga querida o convite para o grande evento: a reunião de Tupperware. Patrícia e eu tínhamos crescido juntas, brincando na rua até tarde (quando isso ainda era possível), andando de bicicleta e roller e fazendo de um pequeno muro, um mercado de faz-de-conta. Não havia como inventar uma desculpa e negar o convite. Aquela criatura tinha dividido a infância comigo! No dia combinado, lá estava eu acompanhando minha mãe e entrando naquela bola de neve. No que fui me meter!

Participei do primeiro evento em uma linda tarde de sábado. Embora, vez ou outra, eu pensasse no desperdício de estar presa àquela situação enquanto o sol me convidava para a rua, confesso que foi bom encontrar com uma porção de vizinhas e conversar com elas. Com algumas eu não falava desde a adolescência. Recordo que eu estava grávida e este foi o principal assunto, depois dos potes, claro. Também este foi o motivo da minha primeira compra: uma garrafinha com lancheira para meu filho. Ao final da tarde, Patrícia ganhou seu mimo. E eu o meu. Só que ainda não tinha me dado conta…

Meu mimo foi poder continuar participando daqueles encontros que, bem ou mal, aproximavam pessoas queridas em torno de um mesmo objetivo. Não sei mais qual era o objetivo. Os potes? O chimarrão? A receita? O bom papo entre vizinhas? O que sei é que a gente dava um jeito de ir para ajudar a outra pessoa a ganhar seu presente da vendedora. Só que, ao mesmo tempo, todas nós ganhávamos o mais belo dos presentes: uma tarde de sábado juntas. Talvez, se o encontro fosse informal, nem todas iriam.

Mas, encarando convite como um compromisso a ser cumprido, a grande maioria sempre estava lá. E eu, incrivelmente, passei a gostar de estar lá.

Essa oportunidade me deu a chance de agradar a Patrícia. Essa oportunidade, também, deu-me a chance me aproximar de sua mãe, Gladis, que há pouco nos deixou. Pena que a bola de neve teve fim… Pena que as reuniões não acontecem mais… Pena que Gladis nos deixou!

Tenho saudade das reuniões de Tupperware. Tenho muito mais saudade da Gladis… De tudo isso, tiro três conclusões: os produtos da Tupperware são caros, mas duram uma vida; a vida, às vezes, dura menos que Tupperware; a amizade é gratuita e dura uma eternidade.







Educadora com formação em Letras Português/Inglês e foquei minha carreira na alfabetização durante quinze anos. Porém, um câncer de boca (localizado na língua) me afastou da sala-de-aula e me fez descobrir o dom que adormecia em mim: a escrita. A doença me deu tempo e uma história para contar. Resolvi registrar no papel como o câncer me curou, transformando-me em alguém melhor. Assim nasceu o livro Impactos do Câncer, que foi lançado no final de 2015. Desde então, sigo escrevendo sobre o que meu coração manda, porque sinto que é essa a contribuição que sei deixar para o mundo.