“Eu sou eu, você é você. Eu faço as minhas coisas e você faz as suas coisas. Eu sou eu, você é você. Não estou neste mundo para viver de acordo com as suas expectativas. E nem você o está para viver de acordo com as minhas. Eu sou eu, você é você. Se por acaso nos encontrarmos, é lindo. Se não, não há o que fazer.” Fritz Perls
A Gestalt-terapia, também conhecida como terapia do contato, é uma das muitas abordagens humanistas da psicoterapia. O contato para a GT é tão fundamental que grande parte da literatura gestáltica é baseada nisso (fronteiras de contato, mecanismos de evitação de contato). Porém, esse contato a que se referem os estudiosos da GT não é exatamente o contato como entendemos de maneira literal, nem somente o encontro com o outro. As formas possíveis de contato descritas na GT são diversas e dinâmicas.
Perls, Hefferline e Goodman descreveram: “contato é todo tipo de relação viva que se dê na fronteira, na interação entre o organismo e o ambiente, é um processo contínuo de reciprocidade em que homem e mundo se transformam. O contato acontece no diferente, é o reconhecimento do outro, o lidar com o outro, o que eu sou, o diferente, o novo, o estranho. O contato acontece na fronteira eu-outro, conhecido-desconhecido, velho-novo, todo contato é dinâmico e criativo”.
Em um sentido mais abstrato, conseguimos encerrar nossos conflitos emocionais quando finalmente entramos em contato com a verdade dos fatos como eles são; quando nos damos conta das verdades que tantas vezes evitamos, justamente por serem tão dolorosas; quando lamentamos nossas histórias mais tristes. Esse momento do “dar-se conta” é fundamental para que deixemos de repetir antigos padrões (neuróticos) de comportamento, que se tornaram anacrônicos e, portanto, inadequados. Dar fechamento aos nossos conflitos emocionais, ou “gestalten”, é fundamental para que façamos as pazes com nossa história e possamos então trazer para o mundo um “eu” mais completo e emocionalmente saudável.
Quando nos referimos ao contato com o outro, ele é autêntico quando ocorre na fronteira, ou seja, quando existe interesse e disponibilidade emocional de ambos, sem que haja manipulações ou invasões. Não é necessário que haja esforço, não é necessário que uma pessoa precise ajustar-se à outra para ser amada ou aceita. Contato autêntico é aquele que inclui as duas partes, e todas as partes dessas duas partes.
Eu sou eu, você é você.
Constantemente me pergunto quanto de mim devo deixar de lado para ser amada? A resposta da GT é clara, nada. Dentro da visão gestáltica, para sermos verdadeiramente amados, devemos incluir (e não alienar) todas as nossas partes que muitas vezes tentamos anular na ânsia de sermos amados. Na prática isso requer um boa dose de bom senso, maturidade, auto-conhecimento e (muito) treino. Isso não quer dizer que não devo me moldar para incluir o desejo do outro, mas que esse desejo de mudar deve ser voluntário.
Nos escritos que ficaram conhecidos como “Oração da Gestalt-terapia” o convite de Fritz Perls, considerado o pai da GT, é para que nos empenhemos em trazer para nossa vida e nossos relacionamentos auto-responsabilização. Eu sou responsável pelo meu caminho, você é responsável pelo seu. Eu sou responsável pelas minhas dores, você é responsável pelas suas. Se por acaso nos encontrarmos, é lindo. Se não, não há o que fazer.
Imagem de capa: Sergey Nivens/shutterstock