Que amanhã eu seja uma pessoa melhor do que fui hoje

Qual é o seu primeiro pensamento ao acordar? É um agradecimento ou uma queixa? Às vezes a gente não dorme tudo o que queria ter dormido; ou não descansou direito porque está muito calor; ou tinha pernilongo; ou percebe resolveu chover justo agora, bem na hora que a gente tem que levantar para ir cuidar da vida…

Eu costumo chamar isso de pensamentos bumerangue; eles estão tão acostumados a ser invocados que acabam voltando para a gente, mesmo sem terem sido chamados. Você joga para o universo, o universo te devolve… essa é uma lei tão, mas tão perfeita que chega a assustar. Pensa bem, se não é verdade…

Tome como exemplo aquele tipo de pessoa que critica tudo, que tem sempre um “até que estava bom, mas…”; ou; “quer apostar como o meu vai vir errado?”; ou ainda, – e talvez seja este o mais famoso – “eu sabia que não ia dar em nada…”.

Essa gente tem um imã para encrenca, para falta de sorte e para insucessos que é de dar medo. Se o peixe tiver uma única espinha, é no prato dessa pessoa que vai cair; se o hotel tiver um único ar condicionado enguiçado, é nesse quarto que ela vai se hospedar; a água aquecida acaba na vez dela; o garçom anota o pedido errado… é impressionante, mas é a mais pura verdade!

Evoque como um outro exemplo – pegando agora um atalho diferente -, aquela pessoa que se acha o ponto de referência em quase tudo na vida: ela é a melhor funcionária do setor (e porque não dizer de toda a empresa, não é mesmo?!); seus filhos são os mais espertos e engraçadinhos; o marido é um “eterno namorado”; a vida dela é tão, mas tão perfeita que ele deveria mesmo era morar em Narnia.

Pois bem… esse segundo tipo encardido é capaz de fantasiar uma felicidade plena e acreditar nela de verdade. E pode até ser que viva satisfeita com isso. Contudo, viver encenando um interminável conto de fadas tem seu preço, e ele não costuma ser muito camarada.

Em algum momento, os sapos, as bruxas, os ogros e fantasmas acabarão aparecendo para cobrar o seu papel na narrativa… afinal de contas, toda história bacana que se preze tem que ter, inclusive, uma boa dose de emoção, confere?

O caso é que em se tratando dessas idílicas pessoas perfeitas, o mal está sempre no outro. Se ela perdeu a compostura foi porque o fulaninho passou dos limites; se ela se atrasou no cumprimento de algum prazo, certamente foi por ser mal assessorada; se ela destrata os funcionários, é porque são completamente incompetentes. O problema está sempre fora delas, à parte de sua responsabilidade, fora do seu alcance. O problema são os outros.

O que esses seres tão especiais parecem não perceber, ou evitar, ou negar mesmo, é que toda a gente – por mais imperfeita que seja –, cada um de nós ganha uma nova ampulheta da vida, cada vez que abre os olhos de manhã. É bem ali, naquele momento de “restart” que a gente tem a chance de quebrar os ciclos viciosos, de jogar fora o dadinho viciado e de tomar nas mãos uma folha bem branquinha… uma folha onde a gente pode se arriscar a escrever uma nova história.

De mim, o que posso dizer, sem nenhum receio de ser julgada, é que neste dia de um janeiro qualquer – nesse finalzinho de tarde -, o balanço que é possível fazer resultará no seguinte saldo: hoje eu já senti inveja; comprei algo de que não precisava; comi uma porcaria que não devia ter comido; fiz de conta que não ouvi uma crítica velada para evitar uma briga inútil; demorei mais tempo do que o necessário no banho e julguei uma pessoa na rua, só porque ela era muito diferente de mim… e olhe que até dar meia-noite ainda temos cinco horas e vinte e um minutos!

De você, eu não sei… mas eu aprendi que a minha capacidade de repetir os mesmos erros ou de criar outros novinhos em folha, é infinita e constantemente renovada. E é por isso, e porque é tão mais fácil tropeçar do que seguir deslizando pela vida que, toda noite, antes de me diluir no esquecimento bendito dessa pequena morte que é o sono, eu murmuro, na esperança de que algum anjo me ouça: “Que amanhã eu seja uma pessoa melhor do que fui hoje!”.

Imagem de capa: Olga Osadchaya/shutterstock







"Ana Macarini é Psicopedagoga e Mestre em Disfunções de Leitura e Escrita. Acredita que todas as palavras têm vida e, exatamente por isso, possuem a capacidade mágica de serem ressignificadas a partir dos olhos de quem as lê!"