…ou como irritar os outros na atualidade sem fazer esforço. Hoje isto não é nem um pouco difícil. Tenha conteúdo, pense, reflita, saiba o que você quer de sua vida, se dedique a sua carreira com esmero, seja gentil e cordial com as pessoas, tenha caridade e ideologia. Com estes atributos é certo que você vai irritar muitas pessoas especialmente os que são superficiais, os que não sabem o que querem da própria vida, os que se entregaram à preguiça, os acomodados, os que não querem ter educação ou o mínimo de cordialidade.
As ideias de bondade, de tolerância, liderança, de sucesso trouxeram em conjunto com o esoterismo e com a distorção do pensamento do cristianismo a convicção de que é possível agradar a tudo e todos, basta querer. Milhares de livros de autoajuda prometem as chaves para fazer amigos, influenciar pessoas, como ser popular, treinamentos e condicionamentos para que o mundo esteja a seus pés na hora desejada.
Tudo bem que só não funciona, muito embora isto alimente financeiramente e ideologicamente várias seitas, cursos, toda indústria do faz de conta que se pode ser super…
Lembro que incomodei muito meus colegas no ensino médio, quando aos 16 anos comecei a ler Freud. Também lembro do celeuma em família quando decidi pela psicologia. Lembro quanto incomodei colegas de profissão quando fui estudar a fundo saúde mental para tratar pessoas com depressão, e do quanto incomodei quando fui chefiar um serviço de desintoxicação de dependentes químicos dentro de uma penitenciária.
Agir incomoda, pensar diferente irrita, e ter certezas sobre a existência é para muitos inaceitável.
Por vivermos em uma sociedade de pensamento hegemônico, massificada, de educação bancária com o padrão da ruptura da criatividade torna-se natural e necessário ao bom convívio que as pessoas se nivelem por baixo. Para que ser diferente se posso ser um nada coletivo, prestar um concursinho e virar um burocrata?
Muita gente vai ficar irritada ao ler este artigo. Especialmente os que abandonaram na vida seu dom, sua vocação genuína e se entregaram.
Outros vão se sentir aliviados, especialmente os que têm sofrido de certa dose de discriminação por que têm seguido a sério sua vocação. A individuação é um caminho solitário, árido e difícil.
Individuar exige a ruptura com o senso comum, com a alienação, dedicação, persistência, obstinação.
E buscar o sentido de vida, individuar incomoda muito muita gente. A evolução acentua naturalmente as diferenças e isto traz muitas pedradas e o sentimento de exclusão e incômodo.
Faz parte do caminho. Basta ler a biografia dos inventores, das pessoas notáveis ou a dos religiosos que você encontra isto lá. Duas dicas fundamentais: procure ter autoconhecimento, saber exatamente quem você é e o que quer; circule, tente expandir as fronteiras dos relacionamentos, isto ajuda a sobreviver.
Jorge Antônio Monteiro de Lima, analista, pesquisador em saúde mental, psicólogo
Fonte indicada: Diário da Manhã
Imagem de capa: baranq/shutterstock
Publicado na CONTI outra com autorização do autor.
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