Meu pai tem quatro filhas mulheres, alguns amigos dele “brincam” e falam que ele veio ao mundo pra ser apenas fornecedor.
Desde quando ajudar a colocar mulheres no mundo é fornecer algum produto? Sim, produto. É assim que a maioria das mulheres é vista. Apenas mais um produto no mercado.
De quem é a culpa da repetição inveterada dessas ideias? A culpa, meus caros, é do menino. A culpa é do menino que ouviu “Prendam suas cabras que meu bode tá solto”.
A culpa é do menino que, desde o primeiro dia de vida (e até mesmo antes dele) tem que conviver (e viver!) sob a ditadura das cores frias, dos infindos tons de azuis, verdes, cinzas. Como se aquilo fosse apenas mais uma imposição da sociedade que insiste que nossos meninos sejam assim: frios como as cores que os vestimos, insensíveis e “durões”.
Dificilmente vemos bebês do sexo masculino desfilando por aí em tons de vermelho, laranja e rosa porque eles, os meninos, têm que aprender desde cedo que essas cores não são cores de homem.
A culpa é do menino que quando foi pra escola de camiseta rosa foi alvo de chacota, foi chamado de “menininha” porque “menino não usa rosa, rosa é cor de menina”. A culpa é do menino que ouviu do pai, da mãe, daquele tio pé no saco… “Essa camiseta é bonita. Mas rosa? Rosa não, olha o tanto que essa azul é mais bonita.”.
A culpa é do menino que foi repreendido ao pegar a boneca da irmã menor pra brincar de comidinha e bebê e teve que ouvir do pai/mãe que seus brinquedos eram os carrinhos e aviões.
Porque, afinal de contas, para que ensiná-los a lidar com bebês e utensílios domésticos se o que basta é ter dinheiro pra comprar um carro do ano? Se eles nunca terão que lidar com seus filhos já que terão sempre uma mulher por perto que foi criada exatamente para lavar, passar, cuidar das crias e limpar a casa?
Sim, sozinhas!
Porque o menino foi criado como um pequeno príncipe tão ignorante a tudo que diz respeito ao lar em que vive que os afazeres domésticos, mesmo que mais simples, eram indignos de toda a grandiosidade que sua masculinidade tem que impor, deve impor.
A culpa é do menino que foi repreendido pelo pai ao chorar quando sentia dor porque “Engole esse choro! Menino não chora! Você quer que as pessoas pensem que você é mariquinhas?”.
A culpa é do menino que foi ensinado a duras penas que demonstrar sentimento era algo indigno e só as mulheres podem fazer. Que foi moldado a não sentir, e, quando não sentir é pedir demais eles foram ensinados a não demonstrar seus sentimentos. “Porque menino bom é menino duro na queda!” e “Olha, esse é meu filho, durão demais, não chora por nada esse aí.”.
A culpa é do menino que quando chegou da escolinha chorando e perguntaram o motivo do choro e quem tinha feito o hematoma no bracinho esquálido respondeu que foi a coleguinha que bateu porque ele foi pegar um brinquedo e ela não deixou teve que ouvir “Mas você já é um homem! Anda apanhando de menininha?” e ele foi lá no outro dia e revidou. E aprendeu que não se leva desaforo pra casa, muito menos dentro dela.
A culpa é do menino que nunca pôde sentir. Na verdade, a culpa é da mãe, do pai, do tio, da avó, do avô… por serem responsáveis por formar meninos tão “durões”. Então, vamos pensar antes de replicar essas frases pros nossos meninos! Para que eles sejam meninos e, futuramente, homens melhores!
Texto de Sarah Stephane N. Carneiro, em 26 de abril de 2016