Não basta a gente amar e pronto. O amor chega e também vai embora, caso não encontre terreno fértil, caso só se encontre preguiça, ausências e indisposição.

Lygia Fagundes Telles escreveu um lindo texto chamado “A disciplina do amor”, sobre um cachorro que aguarda, até a sua morte, pela chegada de seu dono, que havia morrido na guerra. Esse tema, aliás, inspirou o filme “Sempre ao seu lado”, com Richard Gere, e baseia-se na história do cão japonês Hachiko, que esperou por seu dono, na estação de trem, até morrer.

Não há quem não se emocione por uma prova tão linda de amor, por parte, inclusive, de um ser que se julgava irracional. Para além do sentimento, porém, a verdadeira lição que esse fato nos transmite vem a ser a certeza de que o amor não se sustenta por si só, ou seja, amor requer disciplina. Isso quer dizer que, mesmo em se tratando de um sentimento poderoso e prazeroso, o amor requer esforço, vontade, luta e disposição.

O cãozinho poderia simplesmente desistir de ir esperar pelo dono, vencido pelo cansaço e pelas reiteradas frustrações, porém, “disciplinadamente” (como tão bem pontua Lygia), quando chegava a hora exata, lá ia o cachorro demonstrar o seu amor, esperar pelo encontro que tanto lhe fazia bem. Ele acordava todos os dias com a esperança de rever seu dono, porque ele amava e queria amar, desejava manter o amor dentro de si. Todo dia. Todos os dias.

Não basta a gente amar e pronto. O amor chega e também vai embora, caso não encontre terreno fértil, caso só se encontre preguiça, ausências e indisposição. Tudo o que dura possui luta por detrás e lutar por um amor depende de cada um, da vontade de viver e sentir a cada novo dia, renovando-se a afetividade, como se fosse sempre a primeira vez. O amor tem uma força extraordinária, mas não sobrevive de promessas, nem do que já foi um dia e não é mais.

Amar é cuidar, regar, lutar, acordar com o propósito de sentir aquilo tudo que esse sentimento traz, sempre trouxe, desde o primeiro instante em que nos arrebatou os sentidos. É preciso ter disciplina em todos os setores da vida, inclusive nos terrenos afetivos em que acolhemos o amor verdadeiro e que alimenta as nossas esperanças. Todo dia. Todos os dias.

Imagem de capa: Reprodução

Marcel Camargo

"Escrever é como compartilhar olhares, tão vital quanto respirar". É colunista da CONTI outra desde outubro de 2015.

Recent Posts

Com Julia Roberts, o filme mais charmoso da Netflix redefine o que é amar

Se você é fã de comédias românticas que fogem do óbvio, “O Casamento do Meu…

4 horas ago

O comovente documentário da Netflix que te fará enxergar os jogos de videogame de outra forma

Uma história impactante e profundamente emocionante que tem feito muitas pessoas reavaliarem os prórios conceitos.

13 horas ago

Nova comédia romântica natalina da Netflix conquista o público e chega ao TOP 1

Um filme charmoso e devertido para te fazer relaxar no sofá e esquecer dos problemas.

13 horas ago

Marcelo Rubens Paiva fala sobre Fernanda Torres no Oscar: “Se ganhar, será um milagre”

O escritor Marcelo Rubens Paiva, autor do livro que inspirou o filme Ainda Estou Aqui,…

1 dia ago

Série que acaba de estrear causa comoção entre os assinantes da Netflix: “Me acabei de chorar”

A produção, que conta com 8 episódios primorosos, já é uma das 10 mais vistas…

2 dias ago

Além de ‘Ainda Estou Aqui’: Fernanda Torres brilha em outro filme de Walter Salles que está na Netflix

A Abracine (Associação Brasileira de Críticos de Cinema) considera este um dos 50 melhores filmes…

2 dias ago