Por SAMUEL ANTUNES

Vivemos na época do engano. Nós, a geração do avesso, ferimos por vício, viciamos por prazer e achamos prazer no hábito. Achamos graça na morte e a compartilhamos nas redes sociais, ao invés de abraços. Não ouvimos, não esperamos e quase nunca nos atrevemos. Somos fé cega e faca amolada.

Sua santidade, o Dalai Lama, sugere em seu livro “A arte da felicidade”, escrito por ele, mais Howard C. Cutler, que uma das prováveis causas para os males diários da civilização é a falta de empatia entre os seres, ou seja, a falta das pessoas se colocarem mais no lugar umas das outras.

Segundo essa ideia, aqueles que têm a capacidade de compreender e sentir a dor do outro, tendem a se afastar da corrupção e violência. Antes de roubar, independente do motivo e situação social; antes de desviar dinheiro público; antes de matar ou violentar física e/ou mentalmente, pesariam, enfim, o mal que fazem.

A dúvida parece ser então, reconhecer os empecilhos que atrasam essa conscientização e resolvê-los. Olhe ao seu redor: O que é moda? O que tem feito sucesso na mídia popular? Quais são os filmes mais vistos? E as músicas mais ouvidas, os livros mais lidos?

Desde Caim, nosso maior hobbie tem sido a violência. Somos criadores e criaturas, paridos pela própria força bruta; o homem é afinal, o lobo do próprio homem. Uma rápida leitura dos índices sociais prova que a cada ano o homem se torna um assassino ainda mais letal. Se não o revolver que dispara, é a fumaça que polui. Quando não isso, são os olhos que olham sem ver as anormalidades dessa rotina diabólica.

Nosso instinto de autopreservação ainda está lá, mas mais do que isso: há uma inevitável vontade e adoração da morte, como se ainda vivêssemos no calendário regido pelo próprio Thánatos. Vídeos trágicos de gente morta ou sendo morta são repassados como se fossem as boas novas do natal. O gosto pelo sangue dos esportes de contato excita cada vez mais cedo. A sede pela competição acima de qualquer suspeita. A falta de tempo para pensar ou a falta de vontade quando há tempo.

De nada adianta nos educarmos, sermos cultos e polidos ao falar, se ao primeiro gorjeio nos atracarmos feito feras irracionais. De nada adianta reciclarmos nosso lixo se não, de fato, diminuirmos sua produção. Proponho um teste: desçamos juntos do salto para calçarmos os sapatos do mundo. O que você e eu sentimos?

Fonte indicada: Obvious

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