Por Gabriela Gasparin
“Meu pai me acordou e disse: você está incomodando os moradores desta casa. Então, eu acho que é melhor você arrumar outro lugar para ficar. Eram 6h da manhã. Eu estava com um baita sono… Mas falei ‘beleza’. Levantei, coloquei meia dúzia de coisas na mochila, documentos e artigos pessoais. Roupas, sapato, chinelo. Peguei e levei. Fui embora.”
O tatuador Alexandre Eidi Goto tinha 19 anos quando foi expulso de casa porque os pais dele, de origem japonesa e de cultura bastante rígida, não aprovavam tatuagens. Eu conheci a história dele por um acaso, na sala da minha casa, onde ele esteve com seus equipamentos e tintas para tatuar um amigo meu.
Não deu outra. Aproveitei a visita para entrevistá-lo sobre o sentido da vida. Na conversa, Alexandre me contou que ficou anos sem rever os pais desde que foi expulso de casa. Hoje, aos 23 anos, revelou que a única visita que fez a eles ocorreu recentemente.
O jovem fez questão de nunca mais rever os pais até que se estabilizasse como tatuador. Ele queria provar aos dois que a profissão é como todas as outras, e que não há nada de errado em gostar de tatuagens.
É que os pais dele sempre associaram tatuagem com drogas e crimes: um assunto bastante delicado na família. Alexandre explicou que, ao todo, ele tinha três irmãos – totalizando quatro filhos. Só que um deles já tinha sido expulso de casa no passado (antes de Alexandre) por envolvimento com drogas. Anos depois, os familiares souberam que esse irmão foi assassinado.
“Meu estigma foi esse, ser visto como o próximo da lista a se envolver com drogas”, relatou. “Não faço ideia porque eles fizeram isso. Talvez por receio de ver a história se repetindo.”
Desde que foi expulso, Alexandre aprendeu de forma bastante dura a se virar sozinho na vida – e na cidade de São Paulo, onde morava na época. Chegou a dormir na rua, encostado em bancos de terminais de ônibus ou dentro de estações de metrô. Passou noites em casas de amigos ou no estúdio de tatuagem onde trabalhava como aprendiz.
“Eu fiquei pulando de galho em galho. Dormia na casa de um amigo aqui, na casa de outro amigo ali. Enfim, eu também comecei a trabalhar numa oficina de máquinas de tatoos [tatuagem] no centro da cidade, no Anhangabaú. Fui me virando como dava”, relatou.
Por um tempo, trabalhou só pelo almoço e moradia. Aí a situação foi melhorando e ele conseguiu pagar o aluguel numa pensão no centro de São Paulo. Ao final de 2014, conseguiu alugar um espaço para montar o próprio estúdio de tatuagem. Só que neste ano ele resolveu interromper por hora os planos de ter o próprio espaço de trabalho para fazer uma viagem à Europa – juntou economias e pretende trabalhar por lá para pagar os gastos.
“Viajar sempre esteve nos meus planos”, disse. “A viagem é no sentido de dar uma volta pelo mundo, ver o que está acontecendo la fora, absorver isso, crescer, retornar e reabrir meu estúdio.”
Na conversa, eu ainda soube de fatos curiosos na vida de Alexandre. Um deles é que o rapaz foi seminarista. Com 13 anos, colocou na cabeça que queria fazer seminário. E foi estudar em um no Paraná, onde ficou até se formar no ensino médio. “Fui tentado a deixar o seminário. É engraçado dizer isso. A gente sempre culpa essas coisas que acontecem com um ‘foi a tentação, o diabo’. Foi o diabo o caramba, fui eu mesmo. Olhei para o lado e vi que não era isso que eu queria.”
Depois disso, ele se formou em Design (contou com a ajuda de uma namorada, tendo em vista que no período que foi expulso de casa ficou completamente sem dinheiro) e chegou a trabalhar em outras empresas antes de começar a ser tatuador.
A paixão pela tatuagem começou aos poucos. O primeiro contato foi com o namorado de uma amiga, que era tatuador. Alexandre lembrou que a primeira tatuagem que fez foi um “raio” em um amigo que aceitou ser “cobaia”. “Era um raio preto chapado, eu lembro que eu tremia mais do que a máquina.”
Na mesma época, ele fez a primeira tatuagem no próprio corpo, em homenagem ao avô que morreu aos 104 anos. O desenho é de ideogramas japoneses que significam: “como uma erva silvestre”. Alexandre explicou que seu avô sofreu e enfrentou muitas dificuldades quando chegou ao Brasil, vindo do Japão. A frase significa o esforço que o avô fez para sobreviver no novo país, já que a erva cresce no meio das adversidades.
Talvez eu nem precisasse explicar que Alexandre adotou o lema do avô para a própria vida. Ele acredita estar conseguido enfrentar as adversidades e lamenta o preconceito que a família tem com a tatuagem, que é o que ele ama e mais gosta de fazer na vida.
No relato, ele chegou a comentar a marcante frase que “matou internamente os próprios pais”, um relato bastante forte, mas que revela o quanto o jovem deve ter sofrido ao se ver expulso de casa. Alexandre, contudo, disse que se considera “orgulhoso”, já que resolveu não voltar mais para casa e buscou cuidar da própria vida sozinho.
Para ele, o sentido da vida está justamente no trabalho e em lutar para conquistar os objetivos.
“Meu avô dizia que um homem sem trabalho não é um cara digno, um cara respeitoso. Para mim o meu trabalho sempre foi algo muito importante, a tatuagem, no caso.” E completou: “o sentido da vida está em superar a si mesmo”.
Alexandre afirmou que quando fez a primeira tatuagem, tremendo, chegou a pensar que não conseguiria. Mas tratou a inexperiência como um desafio. “Eu acho que é isso, o sentido da vida é superar a si mesmo. Mostrar não para os outros que você pode, mas mostrar para si mesmo. Eu mostrei para mim mesmo que eu podia.”
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