Numa época em que a magreza se tornou objetivo a ser alcançado a qualquer preço, mesmo que signifique prejuízo à saúde e comprometimento emocional, com todo sofrimento psicológico causado pelo desejo de se adequar a padrões estéticos inalcançáveis para a maioria das pessoas, os transtornos alimentares e de autoimagem se multiplicam. Mesmo com todos os avisos (e provas) de que a modelo da capa de revista não tem aquele corpo na vida real, mas apenas no mundo virtual, graças ao photoshop, nem a pele tão lisinha (rugas e marcas de expressão devidamente corrigidas) ou o sorriso tão brilhante (sem ajuda da odontologia estética), meninas cada vez mais jovens, mal saídas da infância, almejam esse tipo de beleza. Elas acreditam que a imagem certa lhes garantirá aceitação e afeto, reconhecimento e sucesso, ou seja, determinará quem serão e o que alcançarão na vida.
O corpo magro passa então de possibilidade a qualidade perseguida, e, dependendo da estrutura emocional da pessoa, a busca por um baixo peso ou membros mais finos, por exemplo, propósito impossível devido às características físicas do indivíduo, pode se transformar em obsessão. E, para vender a ideia de que, quando se quer de verdade, tudo é possível, a indústria da beleza (exterior) investe pesado na ilusão do corpo perfeito, acessível a quem tem dinheiro ou é crédulo o bastante, para achar que é possível modificar predisposições genéticas que determinam a altura, o peso e o formato do corpo. Isso significa que se nasce com a tendência de desenvolver um corpo do tipo ‘maçã’ (predominância de gordura na barriga) ou do tipo ‘pêra’ (cintura fina e quadril maior), entre outras características físicas.
Se a genética predispõe ou não à obesidade, são os hábitos adquiridos que acabam definindo o seu desenvolvimento: alimentação pouco saudável e desequilibrada e sedentarismo são os maiores vilões do aumento de peso. Percebe-se então que ignorar a ciência, ou, no mínimo, desprezar o bom senso, resulta em fracasso e decepção: dietas e fórmulas milagrosas, cremes redutores de medidas e inibidores de apetite funcionam apenas para engordar (desculpem o trocadilho) a conta bancária de quem os comercializa. E quando a autoestima depende dos ponteiros da balança e de uma fantasia de beleza imposta por modelos altas e magras a possibilidade de ser feliz diminui na mesma proporção.
Todos já ouviram falar da anorexia nervosa, mas a psicóloga norte-americana Jennifer Thomas detectou o surgimento de uma variante dessa. Em seu livro Almost anorexia (Quase anorexia, em tradução livre), ela afirma que a quase anorexia está se tornando mais frequente, nos Estados Unidos, do que anorexia nervosa e bulimia nervosa, devido à crescente obsessão com o peso e a forma física. A diferença entre a quase anorexia e a anorexia nervosa resume-se a alguns passos da primeira em direção à segunda. Ambas caracterizam-se por preocupação excessiva com o peso e com dietas; manifestação de problemas com a autoimagem, demonstrada pela comparação com fotos publicadas nas redes sociais e nas revistas; prática exagerada de exercícios físicos, com aumento do tempo e da intensidade; pesar-se constantemente; e resumir os interesses à preocupação com o corpo e o peso, falando sobre isso em eventos sociais, além de monitorar tudo que consome, através de aplicativos de celular, entre outras estratégias. Na anorexia nervosa, o indivíduo termina por se recusar a comer junto a outras pessoas, além de adotar os chamados comportamentos compensatórios, que são utilizar diuréticos, laxantes e remédios para perda de peso, e provocar vômito e enemas.
A pressão social por desempenho, e, consequentemente, sucesso, e a busca por aceitação atingem a todos, mas aqueles com baixa autoestima, que não tiveram orientação ou incentivo para aprimorar a autoconfiança, são os mais vulneráveis a cair nas armadilhas do corpo (e também do rosto) perfeito. Pais que superestimam modelos de beleza e interferem no crescimento saudável das crianças precisam rever seus valores, antes que os filhos adoeçam. Desde cedo, deve-se exaltar a diferença, as particularidades de cada um, pois a beleza vem da diversidade, basta ver a natureza com suas infinitas formas e cores. É preciso também prestar atenção aos primeiros sinais de restrição alimentar (recusa de ingerir alimentos considerados engordativos) e medo intenso de ganhar peso, e buscar ajuda profissional, se a intervenção de familiares e amigos não surtir efeito.