Moço, sinto muito em desapontá-lo, mas meu coração está fechado para balanço. Não, não se trata de amargura ou ressentimento, a questão é outra. Sabe, se fosse há pouco tempo, muito provavelmente, você teria chances comigo, eu seria capaz de te namorar mesmo sem empolgação, só para me livrar da sua insistência. Calma, não julgue a minha versão passada, você não conhece a minha história, tampouco o que me ensinaram sobre o que era amor. Aliás, quer saber? Pensando bem, julgue-me como você bem entender, isso não faz nenhuma diferença para mim.
Sei que a frase é bem clichê, mas vou lhe dizer: o problema sou eu, e não você. Eu passei por uma grande metamorfose, deixei de ser lagarta que rasteja e virei borboleta que voa, encanta e seduz, mas pousa onde ela quiser. Dos tempos de lagarta, não traga nenhuma saudade, apenas sólidos aprendizados. Não perca o seu tempo tentando me convencer de que você é diferente e que vale pena, a questão aqui não é essa. Eu, pela primeira vez, estou inteira e plena, curtindo cada nuance da minha nova versão. Não foi fácil chegar até aqui e superar o que superei. Se fosse possível visualizarmos a alma como visualizamos a pele, você ficaria chocado com a quantidade de cicatrizes que trago.
Entretanto, as cicatrizes que marcam minha alma, tornaram-se minhas tatuagens sagradas. Elas são indolores, apenas me sinalizam o quão guerreira eu fui e sou. Eu as vejo como adornos que enfeitam a minha essência. Você há de convir que nem todo enfeite é bonito aos olhos de todos, contudo, ele possui um significado especial e subjetivo para o dono.
Não fique chateado comigo, não estou te esnobando, você parece ser um rapaz muito bacana, mas, definitivamente, não há espaço para ninguém em meu coração, ao menos por agora. É que demorei tanto tempo para entender que é possível, sim, ser feliz solteira! Eu estou em lua de mel com essa compreensão tão recente. Na minha fase lagarta, eu acreditava que uma mulher precisava de um homem ao lado para ter seu valor confirmado. É que me ensinaram, desde criança, que uma mulher sem um companheiro é como um “cachorro sem dono”. Você faz ideia dos relacionamentos que acabei atraindo ao longo da minha vida em função dessa crença?
Na antiga “faculdade” onde me ensinaram sobre os relacionamentos amorosos, cursei uma disciplina que, dentre outras teorias, afirmava que “se está ruim com um homem, pior será sem ele”. E, eu, como uma aluna muito aplicada, levava essa disciplina muito à sério. Então, qualquer migalha de afeto e respeito tava bom. Acontece que o tempo passou e resolvi cursar outra “faculdade”, nela aprendi novos conceitos com os quais me identifico plenamente, e o principal é que o amor e o sofrimento não são sinônimos. O Lulu Santos canta: “eu me recuso a admitir que amar é sofrer”, eu também me recuso. Aprendi também que afeto é para transbordar e não para ser servido a conta gotas. Então, estou agora assimilando esse aprendizado, quero cristalizá-los em mim, para nunca mais esquecer.
Ainda estou me familiarizando com esses conceitos da nova “faculdade”, eles estão ganhando consistência na minha compreensão, então, preciso protegê-los para que eles não se dissolvam e eu acabe por esquecê-los. Enquanto isso, vou me apaixonando a cada dia por mim. Descobri tanta beleza em mim, tanta poesia, tanto encanto, tanto poder, tanta força e tanta doçura. E decidi: só vou permitir em minha vida, um homem que me veja assim também. Não quero mais homens com alma analfabeta. Eu ainda terei alguém que consiga ler as poesias que trago em cada silêncio e em cada gargalhada.
Ah, que bom que você me compreendeu…sejamos amigos. Vai valer a pena!
Imagem de capa: Juanjo Tugores/shutterstock