Depois de enfrentar sérias complicações de saúde, Manoel de Barros, 97 anos, faleceu hoje (13 de novembro  de 2014) em Campo Grande, Mato Grosso do Sul.

Homem simples e reservado, o poeta ficou conhecido internacionalmente pela beleza de seus textos que sempre conversaram com as insignificâncias do mundo.

Manoel de Barros
por Luyse Costa ilustradora– reprodução autorizada

Ainda me lembro bem. Eu tinha 10 anos e a professora me mostrou, no final do livro de Português, a fotografia de um senhor risonho. Quase dava para ouvir o riso dele… E a professora falou: é poeta e mora no Mato Grosso Sul. O nome dele é Manoel de Barros.

Ela disse isso sem me preparar para esse choque, essa alegria, esse pasmo… Eu acabava de descobrir que ainda existiam poetas. Ao menos um existia. E, Deus! Ele morava relativamente perto, em um estado vizinho do meu. Eu li e o poema fez eco em meu peito. E o sorriso do Manoel cintilava.

Prometi a mim mesma que iria conhecê-lo. Quantas longas conversas tive com ele, em fantasioso diálogo. Quantos poemas eu escrevi ao Barros.  Dele colhi, desde menina, dadivosos conselhos que ele nunca me deu. Aprendi que era bonito ser bocó. Que era grande ser menino. Que a simplicidade é o estágio mais avantajado do indivíduo. Aprendi que a eternidade tem espelho nos caramujos, que o sapo é muito gente, que o cisco revela as entrâncias do universo. Por ele eu me aventurei a fotografar meus silêncios.

Nunca me encontrei com o Manoel. Mas a sua poesia nos irmanou. Ele, irmão mais velho, tanto disse em seus despropósitos, que provei de sua água peneirada e a aprovei.

E hoje, quando Manoel se desprende do corpo e vai prosear com passarinhos de outras paragens, sei que ele, em mim, fez contágio de eternidade. E o eterno e terno sorriso que conheci na infância ficará guardado em todas as eternidades minhas.

“Ele tinha no rosto um sonho de ave extraviada.
Falava em língua de ave e de criança.
Sentia mais prazer de brincar com as palavras
do que de pensar com elas.
Dispensava pensar.
Quando ia em progresso para árvore queria florear.
Gostava mais de fazer floreios com as palavras do
que de fazer ideias com elas.”

Trecho de Poeminha em Língua de Brincar, de Manoel de Barros.


Música: “I Have A Dream” de Sweet Little Band
Ilustrações Martha Barros

Veja também: Escolha uma imagem e leia sua mensagem poética: poemas de Manoel de Barros

Dica da Conti outra: Saiba mais sobre a obra do poeta e conheça os projetos sociais da Fundação Manoel de Barros.

Nara Rúbia Ribeiro: colunista CONTI outra

Escritora, advogada e professora universitária.
Administradora da página oficial do escritor moçambicano Mia Couto.
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Nara Rúbia Ribeiro

Escritora, advogada e professora universitária.

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Nara Rúbia Ribeiro

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