Por Luis Gonzaga Fragoso
A matéria do jornal informa que um grupo de cientistas americanos se debruçou sobre as respostas dadas à pergunta “Quanto tempo dura o amor?”. A pesquisa, realizada na Universidade de Wisconsin, ouviu moradores de 10 mil casas. Conclusão definitiva do estudo: o amor dura, no máximo, três anos. Determinada, portanto, a data de validade do deslumbramento, da paixão. Passada esta fase, garantem os cientistas, o arrebatamento dos primeiros meses se transforma em carinho, amizade, respeito, em qualquer outra coisa.
Lentamente, a ciência tenta derrubar as fronteiras entre a realidade objetiva e a alma. Há muito se canta este sentimento em prosa e verso; vãs tentativas de lhe dar sentido. Agora, colocado sob a lupa científica, ele recebe uma data de validade. Ultrapassada tal data, o “que não tem receita, nem nunca terá” corre o risco de embolorar, mofar.
Vivemos sob a ditadura das estatísticas e dos rankings. Hoje, uma partida de futebol ou um esporte qualquer é analisada à luz dos números. Na academia, o desempenho do docente ou pesquisador é medido pelo número de trabalhos publicados, pela quantidade de congressos de que participou. É a chamada “produtividade”. Você pode ser brilhante; se não produz, se arrisca a ficar fora do jogo.
Curiosa, a precisão da ciência ao determinar este período. O cara ou a garota fazem de tudo para a coisa dar certo, até que um dia deparam com o prazo categórico do cientista: três anos. Encontros tórridos, com troca de presentes e juras de amor podem se estender por mil e poucas noites, se tanto. Terminado este período, segundo os cientistas, a vida do casal será invadida pelo bafo quente da rotina.
Suponho que a geração atual esteja mais sossegada, neste sentido. Seguindo um carpe diem instintivo, talvez simplesmente namorem, e deixem rolar. Há quem opte por ficar – verbo recente em nosso léxico afetivo. Eu só fico curioso em saber a faixa etária de quem elabora esse tipo de pesquisa; saber mais sobre o perfil do leitor que realmente dá trela a tais conclusões científicas.
Em que medida a ansiedade e o medo de perder o parceiro são produtos da indústria de Hollywood, e de seus mitos do amor romântico?, talvez valha a pena perguntar. Afinal, sem o ideal do amor romântico, a indústria do cinema e da canção popular que se alimenta de temas como a ausência da pessoa amada, a dor de cotovelo e a “fossa”, simplesmente entraria em colapso.
Determinar a duração deste sentimento indefinível me soa como uma das muitas pretensões do ego. De tudo que já li sobre o amor, guardo o eco de uma frase de J. Krishnamurti, que provocou em mim uma ressonância de catedral. Não lembro as palavras exatas, mas a essência é esta: você é realmente capaz de amar alguém somente quando consegue eliminar da memória qualquer vestígio do passado desta pessoa. Endosso, e vou além: quando se livra de toda e qualquer ideia pré-concebida, de todos os preconceitos, da imagem cristalizada deste indivíduo, formada a partir de atitudes e comportamento do passado.
Ora, na medida em que o passado é constantemente destruído para ceder espaço ao amor, a própria concepção de tempo perde o sentido – o que, consequentemente, invalida este tal estudo científico. Assim, o verdadeiro amor nasce da intensa experiência do aqui-e-agora, que rompe qualquer vínculo com o passado (arrependimentos, culpa) ou com o futuro (ansiedade, expectativas).
Por trás desta obsessão em medir o tempo de tudo talvez esteja o desejo de controlar o curso dos acontecimentos, de atribuir alguma lógica às coisas do coração. A tentativa de explicar e dar sentido à vida e aos sentimentos traz uma sensação (ilusória) de segurança. Sensação que leva à preocupação com a estabilidade no emprego, o plano de saúde, o seguro de vida, a aposentadoria, e, por fim, com o tipo de jazigo. Basta saber quanta energia física e mental vale a pena investir neste processo. Pois a vida – corda bamba de riscos e aventuras – costuma ignorar planejamentos e qualquer tipo de certeza. E dá razão a Guimarães Rosa: “viver é muito perigoso”.
LUIS GONZAGA FRAGOSO
Tradutor e Revisor
luisgfragoso@terra.com.br
Nota da CONTI outra: A publicação do texto acima foi autorizada pelo autor.
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