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Antes que a delinquência nos bata à porta

Por Maria Cristina Ramos Brito

Os atos infracionais, às vezes graves, cometidos por adolescentes provocam discussões sobre se eles devem ser criminalmente responsabilizados por seus atos. A questão da diminuição da maioridade penal de 18 para 16 anos tem defensores e críticos ferrenhos, e já sem arrasta há bastante tempo. É preciso entender o que pode transformar um jovem em delinquente, e também um olhar atento a atitudes incompatíveis com o crescimento normal e a prevenção de comportamentos inaceitáveis.

Temos entranhado em nossa história uma cultura permissiva, que percebe os sinais de perigo apenas depois de o fato acontecer, quando nada mais pode ser feito para evitá-lo e é preciso lidar com as consequências. Há pouca ou nenhuma preocupação em prevenir desde pequenos conflitos a tragédias muitas vezes anunciadas, no que concerne ao âmbito pessoal ou coletivo. É o que se diz popularmente: colocar o cadeado depois da casa arrombada.

De um lado, famílias desestruturadas, pais estressados, despreparados, rígidos ou permissivos, com expectativas irrealistas em relação ao comportamento dos filhos, que esperam que tudo se resolva por mágica e desejam que a escola dê um jeito nas crianças e adolescentes. De outro, as escolas sem estrutura, regras de conduta claras, professores sobrecarregados, acuados e sem autoridade para orientar e educar alunos que trazem para a sala de aula o mau comportamento tolerado em casa.

Além de uma educação ineficiente, falta de limites claros e de valores éticos e morais, ênfase na aparência, na competitividade, na resolução de desavenças pela força física, há outros fatores que podem contribuir para o surgimento de problemas de conduta e comportamentos antissociais em crianças e adolescentes. Pesquisas recentes na área da genética indicam que filhos de pais com transtorno comportamental têm mais chance de desenvolver o mesmo transtorno, independentemente do tipo de criação que recebam.

Outras possíveis causas para a desobediência e incapacidade de acatar ordens são desequilíbrio hormonal, doenças associadas e vários fatores de risco. Nestes casos, o mais comum é o diagnóstico de transtorno de déficit de atenção/hiperatividade (TDA/H), que se caracteriza por alterações na região frontal do cérebro, responsável pela inibição de comportamentos inadequados. Estas alterações diminuem a produção de dopamina e noradrenalina, o que pode ser tratado com medicação.

Menos conhecidos, há também o transtorno opositivo-desafiador (TOD) e o transtorno de conduta (TC). O TOD distingue-se por desobediência, desafio e comportamento hostil; discussões e impaciência constantes; dificuldade de aceitar regras; perda de controle quando contrariado; não assumir responsabilidade pelos erros e culpar os outros por eles; agir com rancor e ser vingativo. Alguns especialistas creem que o TOD não tratado na criança evolui para o transtorno de conduta na adolescência. O TC é diagnosticado por violações graves como roubo, arrombamento, estupro; agressão e crueldade com animais e pessoas; vandalismo e incêndios; mentiras frequentes para obter vantagens; fugas constantes de casa; ausência de constrangimento ou culpa pelos atos que firam ou desrespeitem os direitos das outras pessoas.

A avaliação correta de transtornos em crianças e adolescentes deve ser feita com muito cuidado, considerando frequência, situações isoladas ou que constituem desvio do padrão de comportamento esperado para idade e sexo, em determinada cultura. Família e professores precisam ser ouvidos, e trabalhar em conjunto para evitar o pior no futuro. E sem a preocupação de procurar culpados, porque o desperdício de vidas jovens atinge toda sociedade.

Maria Cristina Ramos Britto

Psicóloga com especialização em terapia cognitivo-comportamental, trabalha com obesidade, compulsão alimentar e outras compulsões, depressão, transtornos de ansiedade e tudo o mais que provoca sofrimento psíquico. Acredita que a terapia tem por objetivo possibilitar que as pessoas sejam mais conscientes de si mesmas e felizes. Atende no Rio de Janeiro. CRP 05/34753. Contatos através do blog Saúde Mente e Corpo.

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Maria Cristina Ramos Britto

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