Nada é tão grave quanto parece!
A gente é que se esquece de se dar trégua. As coisas têm o tamanho da importância que damos a elas.
Um grampo perdido nada mais é do que um objeto esquecido atrás de um móvel. Mas, para alguns, pode ser a confirmação de um grande defeito: a falta de organização.
Sofre-se pelo grampo perdido ou pela sensação de imperfeição que a constatação da desorganização provoca?
Dar-se trégua não é tarefa das mais fáceis porque envolve um adversário imaginário poderosíssimo: o julgamento do outro.
Em geral, lutamos mais para minimizar “o que os outros vão pensar” do que para ter paz (no dicionário: ausência de conflito).
Consumimos uma energia danada imaginando o-que-será-que- estão-pensando-de-nós e quase não nos damos conta disso.
Quando se trata de um outro relevante, como chefe, irmão, pai, filho, namorado, esposa, marido, mãe, amante ou amigo, aí mesmo é que somos engolidos pelo dragão da nossa imaginação e mastigados pelo receio de que os nossos equívocos e imperfeições os tenham atingido.
Se perdemos uma batalha, automaticamente pensamos no riso de escárnio dos nossos (possíveis) inimigos.
“Eu não devia ter feito aquilo” ou “eu não devia ter dito isso” não são apenas frases de arrependimento, mas pequenas minas que explodem dentro de nós quando imaginamos o efeito dos nossos erros sobre o pensamento do outro acerca da nossa imagem.
No livro “Criatividade – liberando sua força interior“ (Editora Cultrix), Osho oferece uma ampla reflexão sobre os motivos que nos impedem de sermos criativos e coloca o medo da opinião alheia, bem como a necessidade de aprovação, como alguns deles:
“Que tipo de inteligência é essa, que tem que ser confirmada por pessoas tolas? Que tipo de beleza é essa, que tem ser confirmada por pessoas feias? Isso é completamente falso. É tolo! Mas nós continuamos procurando. Continuamos a procurar no mundo exterior apoio para o nosso ego, alguém para nos dar algum estímulo, para nos servir de esteio. De outro modo, há sempre o perigo de nosso ego desmoronar. Assim, sentimo-nos obrigados desse e daquele lado, e disso resulta a preocupação constante”.
Aliás, surpreendi-me enormemente com a leitura. Por puro preconceito nunca havia lido nada do autor e encontrei nas 203 páginas do livro reflexões interessantíssimas com belas pitadas existencialistas, psicanalíticas e, claro, espiritualistas.
Pois bem, não existe liberdade sem escolha! Não podemos controlar nossos sentimentos, mas podemos escolher para onde desejamos direcionar nossos pensamentos – lembrando que pensamentos geram emoções. Não é tarefa das mais fáceis, mas com um pouco de treino (a meditação é uma ótima ferramenta) é possível.
Podemos, por exemplo, passar uma madrugada inteira de insônia imaginando o-que-pensaram-ou-estão-pensando-ou-pensarão-de-nós e nos remoendo com respostas imaginárias negativas ou podemos usar essa mesma madrugada para ler um bom livro ou assistir a um bom filme.
Dar-se trégua é, entre outras coisas, abandonar o vício de se querer perfeito em todo e qualquer pensamento alheio, em todo e qualquer olhar, todo e qualquer espelho. É não se importar com o que não tem importância: a escolha dos outros, o julgamento dos outros. É escolher o contentamento, apesar e além de. É rir dos próprios tropeços.
Quando paramos de pensar obsessivamente em alguma coisa essa coisa perde o efeito sob nós e o que sobra é um imenso espaço vazio de possibilidades – espaço este donde nasce a criatividade. Nas palavras de Osho:
“Quanto mais você pensa, mais você é. O ego não é nada, senão todas as ideias que você acumulou no passado. Quando você não é, Deus é – isso é criatividade”.
Bora vigiar os próprios pensamentos e se dar um cadinho de trégua?