Por Diego Engenho Novo

Eu devia ter nove anos. Aos poucos, todos os garotos da escola foram desaparecendo no portão com as mães pela mão. Naquela manhã, a minha não veio. Eu esperei, esperei tanto e depois que não tinha mais imaginações pra imaginar, nem brincadeiras boas de se brincar comigo mesmo, decidi que já era grandinho o suficiente pra ir embora pra casa, sozinho.

Entrando pela cozinha todo orgulhoso vi minha mãe dar um pulo como se o fogão tivesse dado choque. Bateu a mão na testa e veio correndo me abraçar, ver se estava tudo no lugar – Onde eu ando com a cabeça?! – limpando sujeira nenhuma dos meus braços – Cheguei, mãe – tentando acalmar aquela mulher desesperada – Como você chegou? – Eu vim andando, ué – enquanto ela limpava meu cabelo também de sujeira nenhuma – E você não ficou com medo? – Não, mãe, eu sabia que se eu andasse, andasse, andasse, uma hora eu ia chegar – finalmente arranquei um sorriso dela.

Ok, mães, esquecer o filho acontece. A gente esquece de nós mesmos, não vamos esquecer um filho na escola uma vez na vida? Também não estou fazendo uma apologia a largar a molecada na porta da escola como se fosse um rito de passagem indígena, de jovens que saem sozinhos pra caçar na mata. Aconteceu. Pronto. Mas hoje, quando me lembro da minha carinha sonsa deduzindo que continuar andando simplesmente me levaria ao lugar certo, vejo de quanta sabedoria esse mundo é feito.

Aí está você agora, perdida. Te esqueceram ou te abandonaram? Mudaram a rota do mundo sem avisar que era pra se segurar? Cá estamos nós, atordoados, assustados, com as mudanças, com o desconhecido. É nessa hora que me lembro daquele garoto gorduchinho que sabia que há certos momentos em que o melhor caminho é não se entregar ao medo. Algo muito íntimo segue nos guiando. Pode ser fé, instinto ou mesmo a companhia da doçura da vida.

Naquele dia eu não contei pra ela, mas poucas vezes na vida me senti tão empolgado com algo. Me esquecer na escola foi um dos melhores presentes. Foi naquele dia que descobri que sabia voltar pra casa. É justo nos momentos em que parecemos mais perdidos é que estamos descobrindo o verdadeiro caminho e nossa força inata para trilhá-lo.

Diego Engenho Novo

Escritor, publicitário e filho da dona Betânia. Criador do blog Palavra Crônica, vive em São Paulo de onde escreve sobre relacionamentos e cotidiano.

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