Carta Dezoito.
As explosões ou arroubos emocionais do bipolar _ Como seguir adiante?
Por Elizete Maria Orletti
Sabemos que, em nossas relações rotineiras, sob as normas de uma comunidade humana, com regras seculares, certos episódios são capazes de nos levar a reações adversas, de apatia ocasional ou de sérias indisposições com determinadas pessoas, motivadas por irritações às vezes sem explicações racionais. Como conseguiremos lidar com tais demandas no dia a dia?
Nos seus contatos usuais, nesta sociedade de valores tão densos e complexos, a bipolar pode ser acometida, quando ocorre a perda de controle de suas condutas habituais, de arroubos de raiva passionais.
-Tais circunstâncias são geralmente imprevisíveis, e têm a prerrogativa de levá-la a circunstâncias de explosões verbais com o sujeito com quem se indispõe, através de sinais evidentes de uma agressividade francamente impressionante, e que revela uma total incompreensão aos atores envolvidos.
Estas comoções súbitas são geradas comumente por uma extrema tensão, em que as diferenças expostas, nesses meros acontecimentos, surgem como se fossem psicóticas expressões selvagens desse ente contrariado, e se sobrepõem aos fatos vividos, deixando aquele cidadão perplexo com o nível alterado de inexatidão em nossos comportamentos.
Aqui se desvela a outra face da moeda da sensibilidade debilitante dessa doença afetiva, que se apresenta, agora, de forma feroz e controversa, sendo que, nas conversações anteriores, essa personalidade se portava como usualmente gentil, passando, rapidamente, a uma expressão cabalmente ofensiva, que exibe, com nitidez, a subtração da estabilidade dos seus suportes psíquicos.
Assim, reagimos de duas maneiras quase que invariáveis: na primeira fase, parece que o desconhecido nos tenha ofendido mortalmente, é como se o universo estivesse conspirando contra os nossos pensamentos, sob a psique abalada pelo transtorno afetivo do humor (TAB), que se manifestam de forma bastante influenciada pelos sentimentos negativos, sendo o nosso desafeto momentâneo o portador de um grau incomum de rejeição à nossa presença naquele ambiente.
Desse modo, se revela uma enorme insatisfação em nossa adolescente Maria M., de instantânea abstração da realidade, e que, quando não é bem processada em sua mente, chega a se transformar em uma contrariedade de polos opostos, de modo a que venha a acumular as suas emoções mal resolvidas, somadas à baixa autoestima.
A seguinte vertente é verificada quando em breve retornamos à veracidade dos fatos e das nossas ações instantaneamente invertidas, e podemos tanto sair abruptamente de cena (em que somos os protagonistas desse verdadeiro show patético que criamos, supostamente por engano, ou denotações irreais).
Ou, ainda, sob o inconsciente imensamente perturbado, nos derramarmos, na cara dura, em pedidos de perdão tardios, e com adicionadas flores do bem, aqui, como os símbolos figurativos das nossas culpas imediatas a serem sanadas, o que nem sempre nos absolve diante daqueles que magoamos.
-Mas nós sabemos o quanto somos carentes da doce cordialidade e, simultaneamente, plenas da mais pura paixão, o que vem a nos garantir convivências raras e tocantes, permeadas de promessas, suscetíveis, infelizmente, de serem modificadas pelas conturbações enfermiças.
Estas são capazes de atuar, inclusive, contra os nossos desejos de acertos, o que chega a ser tóxico para a própria aceitação, quando nos movemos, sem uma compreensão plausível, num universo de relações imaturas, ou como nos casos em que interagimos com pretendentes que não são comprometidos na entrega, devotada e fiel.
-Destaco essa hipótese, amiga, para que você reflita, enquanto é factível, mediante os preocupantes ascendentes nesses tempos líquidos e não permanentes, e, por isso é salutar que estejamos com os amigos e a parentela, que simplesmente nos devolvam esse alento de carinho genuíno, e que transborda, muitas vezes, nessas nossas carências desmedidas, porque os passantes podem não suportar tanto amor.
A cada novo encontro com um semelhante, em cada emoção que corre no nosso sangue primitivo de sobreviventes (da fase de depressão e, principalmente, a de euforia contagiante), nos entregamos inteiramente, pela bandeira globalizada do bem querer explorada por um facebook de acessos distintos a amizades rápidas e sedutoras.
Somos então o carnaval de sensações desorganizadas, sim, mas intensas, procurando um ninho, e uma via cabível para a fusão dessas afeições belas e contraditórias, quando amamos bem, mal, ou demais.
-Gostaria ainda de lhe falar, Maria M., sobre o uso do bom senso nos relacionamentos cordiais com os demais indivíduos, em nossas rotinas, para mantermos os limites saudáveis da boa educação. É importante que você mantenha a essencial condição diferenciada dos seus humores bipolares em níveis suportáveis, pois é no acúmulo de momentos difíceis que pode ocorrer o rompimento dos suportes sensíveis, arduamente construídos por nós, nas relações de trabalho e sociais.
-O problema maior, nesses descontroles aparentemente inevitáveis, é um desgaste com os seres próximos, irmãzinha, e destarte, criarmos afastamentos breves ou constantes, danos muitas vezes irreparáveis e, inclusive, perdas desnecessárias.
-Vamos destacar essa questão, nos referindo às ligações íntimas e duradouras, e que são geralmente quem mais sofrem com essa irracional impaciência de sua parte, e que pode vir a se transformar em uma fúria intempestiva e agressiva.
-Essa análoga atitude pode conduzir a sua bipolaridade aos fenômenos que nos remetem à natureza, quando assistimos ao estouro de uma boiada, em que seus corpos são assustados por um fator exterior qualquer, sem regras, rédeas ou leis que os dominem.
“Destroem-se em minutos, feito montes de leivas, antigas roças penosamente cultivadas:
extinguem-se, em lameiros revolvidos, as ipueiras rasas: abatem-se, apisoados, os pousos; ou esvaziam-se, deixando-os os habitantes espavoridos, fugindo para os lados, evitando o rumo retilíneo em que se despenha a “arribada” – milhares de corpos que são um corpo único, monstruoso, informe, indescritível, de animal fantástico, precipitado na carreira doida.”¹
Nos episódios singulares, envolvendo as dependentes com essas desordens temerárias, essa indisposição com os mais amados traz pode advir do excesso de zelo dos parentes, o que pode sufocar essa jovem, e deturpar as suas percepções temporariamente confusas, ou mesmo mascaradas, através de um desconforto preliminar, uma das vertentes dessa nossa abordagem.
As conexões coletivas e familiares dos que têm os caracteres dessa complexa patologia, jásão demasiadamente caracterizadas pelas inconstantes crises pertinentes ao problema de saúde apresentado. Quem convive diretamente com esse drama, é capaz de reconhecer as evoluções de seu parente, e é possível discernir, sem margens de erros, o recolhimento sofrido e involuntário da paciente deprimida, em que fica com o temperamento irritadiço, causando o possível distanciamento com os seus entes queridos.
Tenha fé na sua vida, em Deus, Eliz, novembro de 2015.
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1-CUNHA, Euclides da. Estouro da Boiada, Os Sertões. Editora Record, Rio de Janeiro, RJ, 2000.
Cartas a você, amiga bipolar
(lidando com um cavalo indomável)
Elizete Maria Orletti.
lizorletti@yahoo.com.br
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