Por Adriana Abraham
As palavras não ditas nos acompanham indefinidamente, como uma melodia desarmônica, causando sofrimento a todos os que se aproximam de nós.
O “diálogo” inacabado com alguém que já não faz mais parte do nosso convívio dificulta que sejam estabelecidas relações saudáveis com os demais. Como ouvir quem está diante de nós se constantemente estamos ocupados conversando com outra pessoa que não está presente fisicamente, mas permanece em nossos pensamentos de forma obsessiva?
Quando não temos a oportunidade de expressar a nossa verdade no momento desejado, seja por qualquer motivo, nos tornamos reféns de um diálogo inacabado. Tal fato ocorre com frequência nos relacionamentos afetivos. Saímos de uma discussão ou até mesmo de uma simples conversa com o parceiro e já engatamos num monólogo que nos acompanhará, em algumas infelizes circunstâncias, por toda a vida. Algumas vezes não dá nem tempo de chegar ao elevador. Muitas vezes a discussão ou conversa nem foi devidamente processada.
Em tempo de comunicações instantâneas perdemos a habilidade de nos comunicar com clareza. Preferimos, então, guardar as “palavras ditas” para quando não estivermos na presença do parceiro. Em algumas circunstâncias por acreditar que não seremos ouvidos, respeitados ou até mesmo acolhidos em nossas colocações.
Caminhamos para uma sociedade na qual os casais se expressarão claramente sobre suas necessidades mais íntimas somente quando estão sozinhos, com os amigos ou com o terapeuta.
Aqueles que ousarem desafiar essa regra serão chamados, no mínimo, de carentes. Ter liberdade suficiente para se expressar dentro de um relacionamento, não pode ser confundida com dependência emocional. Isso não significa dizer tudo o que pensa ou até mesmo omitir a verdade com a intenção de manipular ou ferir o parceiro. Isso é crueldade na sua forma mais bruta.
É fato que desde o nascimento buscamos formas hábeis de nos comunicarmos com quem nos cerca. Descobrimos o choro como forma primária de obter o que desejamos. Nesse sentido, negligenciar nossa necessidade básica de comunicação em nome da manutenção de um relacionamento íntimo, mesmo que esse nos cause sofrimento intenso, nada acrescenta ao futuro da relação, tampouco ao crescimento individual de cada parceiro.
O medo de se expor perante o parceiro, de confiar sua fragilidade ao outro, entra na equação como um componente vertiginoso. Ninguém quer sair de um relacionamento “por baixo”.
Preferimos engolir o que é impossível de digerir e depois sofrer os efeitos físicos, psíquicos e principalmente espirituais dessa decisão.
Se a verdade nos libertará, nas palavras do mestre Jesus, o que temos a temer? Uma relação construída sobre bases reais não esmorece diante do primeiro conflito.
Lya Luft, em seu livro “O silêncio dos amantes”, descreve um casal no qual “(…) as coisas não ditas haviam crescido como cogumelos venenosos”. Então, se as palavras que deveríamos ter dito, no momento em que deveríamos ter dito, não forem devidamente expressas, elas apodrecerão lentamente dentro de nós.
Assim, que tenhamos coragem de expressar nossa verdade, de forma digna e no momento adequado, de tal sorte que as palavras ditas simplesmente transcendam, ou seja, que não pertençam mais ao parceiro que as proferiu e sim ao relacionamento de ambos. Que essas palavras posam ajudar a tornar a relação mais consistente, transparente e real. Que não sirvam para outro fim além de transformar a escuridão em luz.
Mantra:
“Que as minhas palavras sejam ouvidas, respeitadas e acolhidas”.
Publicado originalmente em http://www.nowmaste.com.br/
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