Deitado na cama, eu olho para o relógio, passaram-se apenas dez minutos desde a última vez que o olhei. Decido me levantar e ir à cozinha beber um copo d’água. O coração continua batendo em um ritmo frenético, segue em sintonia com a cabeça que dói de forma incontrolável. Não vou tomar outro analgésico; se os três que já tomei hoje não fizeram efeito, o quarto provavelmente não fará. Volto a deitar e tento me acalmar, quero apenas dormir e não sentir o meu peito sufocado por uma falta de ar perturbadora. Quero somente viver sem essa ansiedade que suga toda a minha energia e me impede de respirar.
Se alguém já passou por uma situação parecida com essa, deve saber que um dos maiores males que existe hoje se relaciona a doenças psicossomáticas e, no caso, a ansiedade. O sujeito ansioso faz de tudo para acalmar-se e ter o mínimo necessário para continuar vivendo. Toma chá calmante, faz Yoga, mata-se na academia e, quando o caso é extremo, muitas vezes recorre ao remédio.
No entanto, na maioria dos casos, nada disso funciona. E por quê? Porque o problema é interior e cabe ao próprio indivíduo solucionar. Obviamente, essa solução pode e até deve contar com a ajuda de outra pessoa, inclusive de um profissional. Mas a questão é mais profunda e apenas o ansioso, mesmo com ajuda, pode solucionar esse problema.
Durante muito tempo, fui ansioso – na verdade, muito ansioso -, de modo que a situação retratada no início do texto é extremamente pessoal. Vivemos em um mundo que cobra muito de nós, a mídia vende a imagem de sucesso e cria em nós a demanda do modelo que ela vende. Não se admitem a dor, o choro, a tristeza, o fracasso. Todos devem ser “vencedores”, ter “sucesso” e “sorrir” o tempo inteiro. Não há tempo a perder com “banalidades”, precisamos seguir a cartilha e sermos exemplos de sucesso.
E quanto aos nossos sonhos? Ao que queremos de fato fazer? Ao modo como queremos levar a nossa vida? Será que a obediência a esses ditames não é uma ditadura? Será que o desenvolvimento de uma série de problemas e doenças não é desencadeado pelo estilo de vida que cultuamos?
Pois bem, creio que sim e, durante muito tempo, por mais que não fosse um servo voluntário desse modelo de vida “feliz”, ficava angustiado com o fato de não conseguir responder satisfatoriamente a um mundo que eu nem acreditava como o correto. Paradoxal? Sim, mas, ainda que sejamos considerados inadequados, estamos imersos nesse mundo e, em vários momentos, vemo-nos pondo em prática as regras da cartilha da “felicidade”.
Não é possível ser saudável com tantas cobranças, com tanto peso nas costas. Cada indivíduo é formado por dores e feridas diferentes, assim como possui sonhos e desejos distintos dos demais. Viver aprisionado em um modelo que determina o que se deve fazer e o que é a felicidade, algo tão subjetivo, é realmente o passaporte para se ficar doente.
E, assim, surge a ansiedade. Apertando o peito, retirando o ar, retirando o sono, trazendo dores e até mesmo o ânimo da vida. Todavia, nós não somos máquinas para vivermos vidas robotizadas, com um sorriso no rosto o tempo inteiro. Não somos máquinas, a ponto de não chorarmos ou ficarmos tristes. E, o mais importante, não somos deuses, para sermos o gabarito do mundo, tendo a obrigação de acertar sempre e ser exemplos do que o status quo considera perfeição.
Sempre haverá questões que não saberemos responder. A vida é um mistério, é uma ponte que se atravessa sem saber o que há do outro lado. Entretanto, devemos atravessá-la, ao nosso modo, ao nosso tempo, chorando quando o peito for invadido com uma frente fria de dor e descansando sempre que precisarmos recuperar o fôlego. Não fomos fabricados em série, portanto, seguir modelos só faz mal, bem como, independentemente do que acredite, sempre haverá algo que não conseguirá compreender e é preciso que aprendamos a aceitar as nossas vicissitudes, a finitude da vida e as pedras que existem no caminho.
Não há resposta para tudo, nem eu, nem você, nem ninguém conseguirá encontrar a fórmula de ouro da vida. Sendo assim, não aceite regras que o converterão em uma máquina que deve ser infalível. Não coloque sobre si pesos desnecessários. Fazemos o possível, mas nem sempre esse possível traz o que queríamos.
Erros todos cometem, então, perdoe-se. Se a maior parte da vida é incontrolável, não se preocupe com esta, pois será apenas um ansioso, sobrecarregado de cobranças, esmagado por angústia, que não dorme, não respira e não vive.
Preocupe-se com a parte que você controla e use sua energia naquilo que realmente você quer, naquilo que traz alegria ao seu coração. Aprenda a aceitar que, embora haja coisas que não queríamos que fizessem parte da vida, elas fazem, mas é o que você faz com aquilo que você controla que te define e, assim, não permita que o mercado, a sociedade e/ou você mesmo retirem o seu animus, a sua alma, dando-lhe pesos que o sufocam e o transformam num ansioso, pois a vida é muito curtam para que esteja tão sufocado a ponto de não senti-la.
Como não acredito em fórmulas prontas, essa carta não é uma verdade última, mas acredito que a beleza da vida reside nas singularidades que as pessoas possuem e, quando isso é suprimido por uma doença que, em geral, é causada por um modo de vida estressante, individualizante e opressor, só me resta deixar essas palavras, com a esperança de que cada um possa sentir o âmago da existência e ter o ânimo necessário para atravessar a ponte chamada vida, descobrindo as suas dores e finitudes, enxergando, também, todas as belezas que existem ao longo da caminhada.