A gente tem uma mania irritante de apostar todas as nossas fichas nas mudanças externas. Acabamos depositando expectativas impensáveis sobre as costas do novo emprego, do novo namorado, da próxima viagem, da mudança para uma outra cidade, outro país, outro continente.

Apenas nos esquecemos de um pequeno detalhe: é à nossa atabalhoada pessoa que caberá inaugurar todas essas estreias planejadas, ou não. Somos nós mesmos que teremos de abrir essas novas portas, inaugurar os inusitados destinos ou dar chance a novos relacionamentos, longe da sombra de nossas antigas formas de lidar com os parceiros, com os ambientes, com a vida.

E de nada adianta, comprar uma mala novinha e reluzente, cheia de compartimentos secretos e dotada de rodinhas que giram em 360 graus se a pessoa que vai arrastá-la por aí, permanecer ancorada no mesmo porto, coberto de cracas e presa a uma âncora que já enferrujou faz tempo.

Não vai resolver coisa alguma encaixotar todos os apegos antigos, jurando por todos os deuses que agora será diferente, e ao chegar ao tão sonhado novo lar, retirar das embalagens enroladas em plástico bolha as mesmas inseguranças, as mesmas velhas certezas, os mesmos medos e as surradas dúvidas de estimação.

Será um enorme desperdício de tempo, energia e dinheiro desabalar-se para além das montanhas ou mesmo para o outro lado do oceano, sem ter feito um corajoso mergulho nas próprias águas barrentas de uma vida carregada de mágoas e sair de lá com o firme propósito de deixá-las para sempre no passado, sem direito a visitas retroativas.

O fato é que a gente pode ser protagonista de maravilhosas e transformadoras revoluções, mesmo morando no mesmo endereço físico – aquele com código de endereçamento postal e tudo -, desde que estejamos prontos e dispostos a esfregar as dores encardidas com muita água e sabão, a fim de que não virem uma doença emocional crônica e conformada.

É absolutamente possível descobrir insuspeitas habilidades por trás de nossas crenças auto impostas, segundo as quais “somos desse jeito mesmo”, “sempre será assim”, “nunca teremos sorte”, “jamais seremos capazes”.

É da explosão de minúsculas mudanças em nosso núcleo emocional, aquela pedrinha filosofal que mora no fundo de nós e que nos formata diante da vida, que teremos condições reais de andar com passos diferentes e dançarinos rumo a uma vida menos engessada e da qual já sabemos o roteiro de cor e salteado.

Então… comecemos por uma reforma em nossa casa íntima, essa menina serelepe que se chama alma e que anda meio imobilizada pela nossa ditadura de crenças e projeções. Sejamos o viajante audaz e curioso que abraça com o mesmo interesse e apetite todas as jornadas que a vida puder proporcionar.

Sejamos nós a pessoa nova que será encontrada pelo trabalho que fará arder o peito com aquela chama de empolgação dos que marcaram e compareceram ao encontro com sua missão de vida.
Sejamos nós o coração purificado que estará pronto para uma vida inteira de amores improváveis e leves, esses amores que tiram da gente a melhor parte de nossos corações porque não chegam querendo nos dividir.

Sejamos nós a estrada, a viagem, o vento no rosto, o brilho do sol a se pôr no caminho… E assim estaremos prontos para receber essas tão almejadas e cobiçadas experiências que sempre duvidamos merecer.

Imagem de capa meramente ilustrativa: cena do filme “Foi apenas um sonho”

Ana Macarini

"Ana Macarini é Psicopedagoga e Mestre em Disfunções de Leitura e Escrita. Acredita que todas as palavras têm vida e, exatamente por isso, possuem a capacidade mágica de serem ressignificadas a partir dos olhos de quem as lê!"

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