Coleciono arrependimentos. Tenho uma série deles empilhados na minha estante, ao lado de outras coisas igualmente inúteis: Amores que não servem mais, ressentimentos, um punhado de ilusões e um Tamagoshi. Às vezes me pego rememorando cada um deles e algo em mim parece se acender, se movimentar. Meu corpo reage fisicamente. E como se eu estivesse lá outra vez, no momento exato em que tudo aconteceu, converso comigo mesmo no passado, dou conselhos, acolho, ofereço uns bons desaforos, digo: “Sai daí!”, ou “Não diz isso!”, ou “Volta lá, seu idiota! Conserta a situação!”. Sim, tenho arrependimentos de estimação. E sim, a coleção nunca para de crescer. A cada nova temporada, mais arrependimentos vão parar na estante. É justo dizer que alguns cumprem o seu papel e um dia são descartados. Mas muitos deles ainda estão ali me encarando todos os dias, como troféus brilhantes e lustrosos.
Eu me arrependo, não necessariamente nesta ordem, e sim citar todos, de cada uma das inúmeras juras de amor eterno em textos piegas que postei no Facebook, endereçadas àquela pessoa que, definitivamente, não foi um caso de amor eterno. Eu me arrependo de todos os meus rompantes de infantilidade no início da manhã depois de ser expulso da cama pelo despertador em horário impraticável. Eu continuo me arrependendo todas as vezes que entro em uma loja para comprar algo de que preciso e saio de lá sem o que preciso, mas com dezenas de coisas inúteis que fizeram brilhar os meus olhos. Eu me arrependo na maioria das vezes que me descuido de mim mesmo e acabo soltando aquela piada inconveniente na mesa do jantar em família, causando atritos inimagináveis. Eu me arrependo de ter oferecido a minha confiança àquela pessoa que sequer merecia a minha atenção. Eu me arrependo de ter falado, eu me arrependo de ter feito, eu me arrependo de não ter feito, e a lista continua crescendo.
Eles estão na minha estante porque tenho apreço por eles. Cada um dos meus arrependimentos é como uma linha da minha impressão digital, ou como uma peça do gigantesco quebra-cabeça que forma a minha identidade. É olhando para mim mesmo, para as minhas falhas, para os meus muitos tropeços, que eu sei quem sou. Eu sou todos os meus amores, dos intensamente vividos aos que nem floresceram, eu sou as brigas, as gafes, as péssimas escolhas, aquele corte de cabelo horrível na infância. Aceitar meus arrependimentos é ter carinho pela minha história. Além do mais, errar mil vezes é o preço que se paga por viver na voltagem máxima. Só não se arrepende quem não viveu.
É olhando todos os dias para a minha coleção de arrependimentos que eu escolho, conscientemente, continuar vivendo. Porque eu prefiro ser uma pessoa poluída com mil memórias, experiências e cicatrizes a encarar o vazio de uma vida mal vivida.
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