Quase sempre o tempo é curto e a ansiedade de viver tantas coisas juntas nos faz postergar o essencial.
Postergamos até que um dia nos cortam a energia da casa, da escola, do escritório, da academia e do prédio no qual moramos, fazendo, por vezes, parar o elevador que nos acolhe também.
E ao nos vermos no escuro, passado o pânico inicial, desencadeado pela surpresa do inesperado, uma luz se acende em nós.
Vai-se a televisão, adormece o computador, morre a máquina de lavar pratos e roupas e nós acordamos. Despertamos de um transe profundo e as tarefas antes urgentes tem então que ser adiadas.
Vai-se a energia, cortam a força e ficamos nós.
Em desespero há os que sacodem os filhos para as camas, a fim de que fechem os olhos sem sono, para que se evadam da realidade, daquela da proximidade, saciada por palavras, gestos e brincadeiras, para enfim acordarem em uma outra, em uma na qual o convívio e a atenção não recebem a devida medida.
Alguns se esquecem que, ao resistirmos à vontade de adormecer, podemos enfim contemplar um céu estrelado, exercitar a reflexão de nossas idéias, encontrar respostas particulares e buscar, na tênue penumbra, dois ou mais pares de olhos para compartilhar o nosso eu.
Puxemos então a cadeira no trabalho e em círculo, ladeando as margens de uma lanterna, entoemos palavras melódicas de esquecidos versos. Chamemos os filhos para perto de nós e contemos as mais belas histórias dos que antes de nós vieram. Puxemos os amigos da academia e conversemos sobre a saúde do corpo e como ela é importante no auxílio da saúde da alma. Enlacemos os braços dos colegas na escola e voltemos a brincar de roda, de dominó, de jogo da velha ao som de cantigas infantis.
O mundo desperta sem luz, o mundo redescobre a delícia de partilhar boas recordações, boas informações, boas soluções.
O estranho no elevador não é tão estranho. Ele também tem uma vida como a nossa, também tem preocupações infundadas e medos bobos. Ele estava adormecido e tinha se esquecido, assim como nós, de como é bom buscar no outro o melhor de si.
Que se apaguem as luzes mais vezes, para que possamos sentir as chamas das velas tremularem por nossas moradas e para que um inédito teatro de sombras possa ser encenado por nós e pelos nossos filhos, fazendo-os esquecer do vídeo game e do tablet recheado de avisos comerciais.
Cortem a energia mais vezes, por favor, para que nos lembremos que existe uma vida bonita por trás de toda a parafernália tecnológica, sem a qual erroneamente imaginamos não conseguir viver.
Cortem a força sempre que puderem, para que não nos sobrem desculpas para deixarmos de ser o melhor que podemos ser, no presente. No tempo do agora, no tempo em que somos tão belamente tudo de nós.
“Palavras são mágicas, são como encantamentos sublimes que nos levam para onde quisermos, seja esse onde um lugar ou uma pessoa”. Acompanhe a autora no Facebook pela sua comunidade Vanelli Doratioto – Alcova Moderna.
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