Ana Macarini

Não está fácil para ninguém! Mas fica menos difícil para quem arregaça as mangas!

Imagem Zadorozhnyi Viktor/Shutterstock

Ela começou vendendo picolés numa caixa de isopor, na pequena cidade onde morava. Aproveitou o fato de que em Itinga (Norte de Minas Gerais), não havia energia elétrica e fez sucesso com seus picolés na saída das missas. Sabrina Nunes não tem medo de desafios. Foi por isso que deixou a pequena Itinga para trás e foi ser cortadora de cana numa outra cidade maior, onde poderia ter mais oportunidade. Cortou cana por pouco mais de um mês, virou secretária na mesma empresa. E é com orgulho que conta: “O tempo que fiquei cortando cana foi difícil. Mas era o que eu tinha para fazer. Lá mesmo eu fiz contatos para conseguir me recolocar. Eu só agarrei a oportunidade, sem coitadismo.” Depois de sete anos trabalhando como secretária, conseguiu uma bolsa de estudos e mudou-se para o Rio de Janeiro, onde foi cursar Engenharia. Enquanto estudava, arrumou emprego num escritório, valendo-se da experiência anterior. Decidiu fazer alguma coisa para complementar a renda. Investiu R$50 em material e começou a produzir bijouterias. Batizou o pequeno empreendimento com o nome de Francisca Joias, em homenagem à sua avó. Começou vendendo pela Internet, através de uma plataforma especializada em artesanato. Tudo o que ganhava era reinvestido. Como deu muito certo, decidiu criar sua própria loja virtual. A crise econômica foi vista como uma oportunidade, Sabrina decidiu contratar algumas revendedoras (mulheres que haviam perdido o emprego), e assim, incrementar os canais de venda para seus produtos. Hoje a empresa conta com 620 parceiras de venda, que compram os produtos com 40% de desconto no e-commerce e revendem pelo mesmo preço da plataforma. “Com o desconto, eu perco margem de lucro, mas aumento meu número de vendas. Além disso, dou chance a quem precisa trabalhar”, afirma Sabrina.

Geraldo Rufino é dono da empresa JR DIESEL, especializada em peças usadas para caminhões e tem, hoje em dia um faturamento anual que gira em torno de R$50 milhões. O começo da sua história foi um “negócio próprio” que ele inaugurou aos 7 anos de idade, Rufino catava latinhas. A diferença entre esse homem e outros milhares de catadores de latinhas é a postura diante do problema; enquanto a maioria paralisa diante de um fracasso, Rufino tem aquela garra que só os apaixonados têm: ele aprende, tira uma lição e se transforma. Não deu certo o negócio das latinhas? Segundo ele, deu tão certo que virou uma Kombi velha, que virou um caminhão velho, que virou dois caminhões velhos que viraram um negócio formalizado de peças de caminhão. Enquanto muitos ficam sentados diante das dificuldades e se lamentam, Geraldo Rufino trabalha 12 horas por dia e garante que se diverte muito com isso.

Duas meninas que resolveram desbravar uma área de negócios tradicionalmente masculina: a marcenaria. Letícia Piagentini e Fernanda Amaral são sócias e criam com suas próprias mãos todas as peças de madeira e tapeçaria. A Lumberjills, marcenaria, nasceu de um sonho da dupla em trabalhar com artefatos. Eram colegas de trabalho na área de vendas e hoje tocam, juntas, seu próprio negócio. E o que era hobby virou um empreendimento de sucesso. As garotas investiram R$20 mil para iniciar o negócio, fizeram cursos de aprimoramento em design e marcenaria e apostaram em um nicho promissor: jovens que curtem móveis “descolados”, mas não querem gastar muito. Acertaram em cheio! As vendas, por enquanto, concentram-se entre Santo André e São Paulo; os móveis são feitos por encomenda. Fernanda e Letícia, idealizam, projetam, confeccionam e instalam. Tudo é feito de forma artesanal, sob demanda, por isso elas não têm estoque. “Ao contrário de marcenarias que trabalham em escala industrial, nós não negamos nenhuma peça, nem que seja um abridor de garrafa ou uma única prateleira. Muitas pessoas nos procuram exatamente para isso. Nós tentamos aproveitar cada pedacinho de madeira que sobra”, afirma Fernanda. O projeto para 2017 é investir no e-commerce para ampliar os horizontes de negócios.

Henrique Fogaça, o chef tatuado que compõe o trio de jurados do Programa Mastercheff, não nasceu cozinheiro. Fogaça era bancário, começou e abandonou dois cursos acadêmicos, Arquitetura e Comércio Exterior. Alimentava-se basicamente de pratos congelados, até que cansou de comer comida ruim e passou a arriscar-se na cozinha para produzir suas próprias refeições. O moço contava com a luxuosa consultoria de sua mãe e sua avó, duas cozinheiras de mão cheia. Fazia sua marmita com recheios simples: arroz, feijão, bife empanado, frango assado, nada de comida sofisticada. Incentivado pela mãe inscreveu-se no vestibular para o curso de Gastronomia; passou, cursou e se encontrou. Pediu demissão do banco, comprou e equipou uma Kombi, onde fazia e vendia sanduíches caprichados de hambúrguer, carne louca e linguiça. O negócio acabou não vingando. Mas o cara não se intimidou, não. Passou a vender sanduíches na baguete, bolo de laranja e mousse de chocolate (doces de sua infância), de porta em porta. Trabalhou no D.O.M, restaurante do renomado e premiado chef Alex Atala. Seu primeiro negócio próprio foi um pequeno café na Galeria Vermelho, espaço de arte contemporânea na cidade de São Paulo. Hoje, Henrique é um próspero empresário da área de Gastronomia, toca quatro restaurantes de sucesso e garante que “Comida tem que ter nome de comida. Tem que satisfazer, ser farta. Não pode ser artigo de luxo. Afinal, é algo primitivo, ligado a coisas básicas como a sobrevivência e o prazer.”

O que há de comum entre essas histórias? Qual é o ponto de intersecção entre as trajetórias de Geraldo, Sabrina, Henrique, Fernanda e Letícia? À primeira vista, nada, nenhum ponto de intersecção. O que poderia haver de coincidente entre caminhões velhos, bijouterias originais, móveis descolados e comida boa?! O ponto de encontro entre o sonho dos cinco empreendedores é a capacidade de tirar de um problema, de uma situação de crise, insatisfação ou perda, o combustível para se reinventar e mudar sua trajetória, não apenas profissional, mas da própria vida. Em todos os relatos aparece a ideia do trabalho como fonte de alegria e prazer.

O Brasil passa por uma crise gravíssima que tem em seu cerne, além da questão econômica, a quebra de expectativa, a sensação de desamparo e de descaso. Esse pode ser um ambiente propício para gerar aumento de casos de falência financeira, desemprego e falta de perspectivas. Mas, há quem sobreviva. Há outras tantas histórias de pessoas comuns, gente que não aparece na mídia, homens e mulheres que não ficaram famosos, não são grandes empresários; mas tiveram a coragem de arregaçar as mangas e olhar para a vida como um lugar de oportunidades. Há gente que afunda na crise e há gente que aprende a navegar com ela.

Ana Macarini

"Ana Macarini é Psicopedagoga e Mestre em Disfunções de Leitura e Escrita. Acredita que todas as palavras têm vida e, exatamente por isso, possuem a capacidade mágica de serem ressignificadas a partir dos olhos de quem as lê!"

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