Quem nunca resmungou ou ao menos pensou em se culpar por mal feitos alheios, por medo, preguiça, ou por conveniência?
– Eu não deveria ter falado isso ou aquilo. Criei tensão e deu no que deu;
– Eu deveria ter esperado um pouco mais, mesmo depois de tanto tempo;
– Eu poderia tentar esquecer aquele gesto impensado. Talvez não tenha sido proposital… nem doeu tanto assim;
– Eu gostaria de mais atenção, mas talvez eu não seja uma boa companhia…
E sim, afinal consegui me sentir culpada por tudo. Uma palavra torta, um baita de um bolo, um esquecimento, uma passada de perna, uma violência… e as coisas só se complicam, mas certamente eu poderia ter evitado, ou aliviado, ou relevado, ou tudo isso e ainda pedindo desculpas. Em mim cabe toda a culpa do mundo e eu me declaro culpada talvez para não ter que enxergar a maldade alheia, para não admitir as minhas escolhas equivocadas, para tentar desajeitadamente consertar o que?
Isso não é bondade, não é altruísmo, não é civilidade. Está bem perto de ser outra forma de manipulação. O culpado declarado desarma o verdadeiro culpado, gera piedade, mostra uma sinceridade inocente, uma delicada fragilidade. Sempre a postos para pegar para si as culpas e as responsabilidades. E sempre livrando outras caras.
– Sim, eu poderia ter feito algo para evitar isso, mas não fiz. Além de culpada, sou omissa. É tudo culpa minha.
Mas sabe o que? Dei para discordar desse modelo de vida, onde, em qualquer nível, um assume a arrumação para o outro cantarolar. Ando mesmo decidida a me declarar inocente!
Inocente por permitir a arrogância alheia no meu território;
Inocente por crer que algumas coisas podem ser resolvidas amigavelmente; Inocente por deixar o tempo passar demais;
Inocente por me sentir culpada pelo que não fiz.
Eu me declaro inocente, agora com muita malícia, a mesma que recusei antes, para não voltar atrás. Não carrego mais culpas, nem desculpas.
E tudo isso, em legítima, incontestável e incondicional defesa. Quem irá me culpar?