Por Martha Medeiros

Pais de família estão cada vez mais participativos, atuantes, necessários, afetivos, fundamentais na criação dos filhos, ao contrário do que acontecia nas gerações anteriores, quando o pai era uma figura cerimoniosa, o provedor que detinha a última palavra nas questões graves e terceirizava o resto. Hoje não. Hoje os pais deitam, rolam, se embolam, se envolvem nas pequenezas cotidianas, são quase mães.

Quase. Porque tem uma coisa que a maioria deles ainda não consegue assumir: a desagradável tarefa de fazer-se odiar.

Li essa frase num livro (em outro contexto) e achei que fechava perfeitamente com a maternidade. O que é ser mãe, senão tomar para si o papel de chata da família?

As cobranças do dia a dia são especialidade nossa: o que comeu, o que vestiu, se tomou banho, a toalha no chão, os garranchos, o blusão amarfanhado, a luz que ficou acesa, liga pra tua vó, o estado deplorável do tênis, a hora em que foi dormir, segura direito esse talher, deixa de preguiça, cuidado ao atravessar, não durma de cabelo molhado, largue esse computador, menos palavrão, hora de acordar, a consulta no dentista, e esse amigo mal encarado, e esse decote provocante, convida os teus primos, não tranca a porta à chave, fecha a janela, abre a janela, não corre pela casa, me avisa assim que chegar, tu anda bebendo?

Não que o pai seja relapso, mas se ele ainda vive com a mãe das crianças, a patrulha cotidiana possivelmente ficará a cargo do sargento de saias. Nós, tão femininas, tão doces, tão sensíveis, tão amorosas, não pensamos duas vezes em abrir mão desses nossos suaves atributos caricaturais a fim de manter a casa de pé, a roda girando, a vida funcionando, todo mundo no eixo. Se tivermos que ser antipáticas, seremos. Se tivermos que ser repetitivas, que jeito. Controladoras? Pois é. Alguém tem que se encarregar do trabalho sujo.

É uma generalização, eu sei, mas amparada no senso comum. Os pais mandam, ralham, brigam, mas raramente perdem a cabeça, quase nunca gritam e se estressam. Eles têm essa irritante capacidade de manter a boa reputação com os filhos. Se forem obrigados a escolher um lado durante o barraco, dirão que estão do lado da mãe, que estão de acordo com tudo o que ela disse, mas irão piscar para o filho quando ela não estiver olhando.

Ao fim e ao cabo, mães dão conta de todas as crianças da casa. Todas.

É o nosso papel: reger a orquestra familiar ofertando nosso melhor, mesmo que ele seja confundido com nosso pior. É o risco que corremos, mas não há outra maneira de educar. O excesso de zelo pode ser estafante, mas é preciso segurar o tranco de ser odiada um pouquinho a cada dia a fim de garantir um amor pra sempre.

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