“DOLCE FAR NIENTE”: a doçura de não fazer nada

É preciso, mesmo que por breves instantes ao longo do dia, parar, demorar-se, sentir o prazer de nada fazer, nada ter que fazer, nada a se cobrar, sem pressa, sem olhar o relógio a cada minuto, sem culpa por estender-se na cama. É preciso dar um tempo a nós mesmos, pois temos o direito, sim, de estar com preguiça vez ou outra.

Nossa sociedade vive cansada, estressada, de mau humor, correndo contra o relógio e com a impressão de que não vai dar tempo de fazer nada do que planejara. Desde crianças, somos levados a valorizar o trabalho, o movimento, o não ficar parado, pois, como diz o ditado, Deus ajuda quem cedo madruga – demorar-se na cama é sacrilégio!

Nesse contexto, acabamos por evitar a parada, a quietude, afinal, tempo é dinheiro e não deve ser jogado fora com nada que não seja produtivo. É preciso trabalhar até a exaustão, se possível pulando as refeições ou encurtando o horário de almoço, sem essa de ficar sentado conversando trivialidades à mesa, pois o serviço está urgindo à nossa espera.

E essa sistemática encontra terreno propício para que se fortaleça na atual cultura do status, em que as posses materiais é que determinam o quanto vencemos na vida. Não dá mais para trabalhar oito horas diárias, é necessário preencher os três períodos com trabalho, porque é assim – dizem – que ganhamos dinheiro, porque quem é rico trabalhou e trabalha muito.

No entanto, toda essa pressa atarefada acaba nos adoecendo, senão o físico, a alma, afastando-nos de nossa essência, da construção de sonhos e de ideais que só são possíveis na calmaria, na lentidão silenciosa de nosso respirar. Sem estacionarmos os nossos sentidos por veredas distantes da correria e do burburinho cotidiano, não conseguimos nos reequilibrar emocionalmente.

É preciso parar, demorar-se, sentir o prazer de nada fazer, nada ter que fazer, nada a se cobrar, mesmo que por breves instantes ao longo do dia, mergulhando os pensamentos no vazio das ideias aparentemente inúteis. É preciso não ter pressa, não olhar o relógio a cada minuto, não sentir culpa por se estender demoradamente na cama, após ter tocado o despertador. É preciso dar um tempo a nós mesmos, pois podemos, sim, estar com preguiça vez ou outra.

Ainda mais importante do que presentearmos a nós mesmos com esses instantes de ócio, é fazermos tudo isso sem nenhum sentimento de culpa, sem medo de sermos punidos pela vida por conta desses momentos de ócio. Teremos que estar cientes das benesses que o não fazer também nos traz, pois é desse modo que reconciliamos nossa energia mental ao restante de nosso corpo.

É assim que conseguiremos, mesmo cansados, ao fim do dia, todos os dias, abraçar quem caminha ali ao nosso lado, com ternura renovada e sincera, porque então ainda nos restarão forças para cultivar o amor que deverá sempre nos guiar a vida.

Marcel Camargo

"Escrever é como compartilhar olhares, tão vital quanto respirar". É colunista da CONTI outra desde outubro de 2015.

Recent Posts

Tire as crianças da sala antes de dar o play nesta série cheia de segundas intenções na Netflix

Uma série perfeita para maratonar em um fim de semana, com uma taça de vinho…

2 dias ago

Você não vai encontrar outro filme mais tenso e envolvente do que este na Netflix

Alerta Lobo ( Le Chant du Loup , 2019) é um thriller tenso e envolvente…

2 dias ago

Trem turístico promete ligar RJ e MG com belas paisagens a partir de 2025

Uma nova atração turística promete movimentar o turismo nas divisas entre o Rio de Janeiro…

2 dias ago

Panetone também altera bafômetro e causa polêmica entre motoristas

O Detran de Goiás (Detran-GO) divulgou uma informação curiosa que tem gerado discussão nas redes…

2 dias ago

Homem com maior QI do mundo diz ter uma resposta para o que acontece após a morte

Christopher Michael Langan, cujo QI é superior ao de Albert Einstein e ao de Stephen…

3 dias ago

Novo filme da Netflix retrata uma inspiradora história real que poucos conhecem

O filme, que já figura entre os pré-selecionados do Oscar 2025 em duas categorias, reúne…

3 dias ago