Marcel Camargo

Em uma sociedade que lucra com sua insegurança, gostar de si mesmo é um ato de rebeldia

A tristeza é lucrativa para muitas pessoas. O medo também. Livros, medicamentos, profissionais, empresas, indústrias, mídia em geral, há um enorme contingente de pessoas que sobrevivem e até se enriquecem às custas das inseguranças alheias. Logicamente, há boas intenções em meio a quem lida com a tristeza do outro, porém, a muitos é interessante que sempre haja cidadãos inseguros, gastando dinheiro para fugir ao que lhes fragiliza.

Livros de autoajuda abundam nas prateleiras das livrarias, vídeos motivacionais existem aos montes no Youtube, bem como frases do tipo seguem firmes nas redes sociais.

Palestras, conferências, simpósios que tratam de temas afins a isso tudo são recorrentes. Hoje, os coachs, inclusive, são bastante procurados, a ponto de serem questionados por psicólogos, que veem seus espaços diminuídos por eles. As pessoas, como se vê, necessitam cada vez mais de ajuda, de saídas, de escapes, de alívio da alma.

Este século parece ser o século da depressão, da insatisfação, da tristeza, século das almas adoecidas. E isso é sério. Isso deve nos levar a buscar as causas desse mal-estar generalizado, para se combater aquilo que adoece, em vez de apenas focar no que ameniza as suas consequências. Muitos males, aliás, teriam um combate mais eficaz, caso fossem canalizados esforços em direção às suas causas e não aos efeitos, como comumente se faz.

Não é preciso aprofundar muito nestas questões, para que se perceba que a superficialidade das relações, dos sentimentos, bem como a supervalorização das aparências, em detrimento da essência, acabam por adoecer nossos corpos e nossas almas. Hoje, é preciso consumir, é preciso ser bonito, é preciso ser sarado, é preciso ser forte o tempo todo. Mas ninguém consegue ser tudo isso, muitos nem chegam perto disso, e a tristeza vem, junto com um vazio que compra alguma preenche, tampouco botox.

Logicamente, existem muitos fatores que influenciam o emocional de cada um, tais como ambientes familiares, condições genéticas, entre outros, porém, o vazio existencial é uma urgência que deve ser combatida em seus determinantes, entendendo que aquilo que nos salvará não se trata tão somente de medicações ou de materialidades palpáveis. Acompanhamento psiquiátrico e psicológico, medicações e terapias, são extremamente importantes nesse processo, sim, mas é preciso entender que lidar com os próprios sentimentos envolve, sobretudo, aceitar-se em tudo o que se é.

E aceitar a si mesmo implica ser feliz com o que se tem, com o que se vê no espelho, com o que se pensa, a despeito do que a mídia veicula como desejável. É por isso que gostar de si mesmo, nesse contexto, vem a ser um ato de rebeldia, afinal, poucas coisas e poucas pessoas conseguirão nos ferir, nem nós mesmos conseguiremos nos ferir, quando nos aceitarmos, quando nos amarmos, quando aquilo que for de dentro, o nosso íntimo, trouxer felicidade e contentamento. Seja num hotel de luxo, seja numa casinha de sapê.

* O título deste artigo é uma citação de Caroline Caldwell.

Marcel Camargo

"Escrever é como compartilhar olhares, tão vital quanto respirar". É colunista da CONTI outra desde outubro de 2015.

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