O fim de um relacionamento encontra duas pessoas absolutamente diferentes daquelas que outrora estiveram apaixonadas. Aqui, neste ponto, há memórias que fazem brotar sorrisos inevitáveis e francos; há lembranças que fazem arder os olhos como reflexo das dores sofridas; há feridas; cicatrizes; metamorfoses. O casal que deu o primeiro passo naquele momento em que não se sabe se o arrepio é da alma ou da pele; agora pensa que se pudesse “voltar a fita” teria feito outras escolhas; teria lutado por mais momentos de pele arrepiada e menos momentos de lábios crispados. Esse casal aqui está perdido e se pergunta “Era amor?”; “E se era, o que aconteceu com esse amor?”.
Somos tão ingenuamente afetados pelas definitivas verdades que ouvimos por aí, que insistimos em acreditar que tudo o que é maravilhoso tem de ser perfeito. Ora, se isso fosse verdade, pobres criaturas seríamos! Posto que a perfeição não existe, teríamos de negar a extraordinária beleza dos nossos primeiros passos; a arrebatadora excitação do primeiro beijo; a avassaladora libertação advinda das primeiras conquistas por conta própria. Maravilhas imperfeitas que fazem a nossa vida ganhar sentido; sabor; cor e luz.
Negar a beleza da imperfeição é como abrir mão das experiências em troca de uma vida pasteurizada e absolutamente insossa. A graça dessa aventura aqui está, justamente, na experimentação; nas tentativas desajeitadas; no jeito único que cada um de nós tem de interpretar e interagir com o mundo. O tempero da vida é a mistura de suor; riso e lágrimas que faz da nossa jornada algo que valha a pena.
A jornada será tão espetacular quanto verdadeira, a depender de quanto amor tenha sido injetado, desde que fomos concebidos até nosso último sopro de vida. É o amor a única doutrina capaz de agregar e acolher as mais diferentes crenças e, ainda, aqueles que não creem em nada. O amor, em sua forma legítima; aquele amor que entende o diferente, apesar de discordar dele; que fica feliz a partir da conquista do outro; que liberta, em vez de aprisionar; que faz crescer, em vez de sobrepujar. Esse amor é chama de vida e precisa estar presente, como essência e não como adorno, em qualquer relação à qual escolhamos nos entregar.
Assim, ainda que não dure para sempre; ou mesmo, que só dure alguns dias; ou até mesmo que seja um amor de almas, terá sido amor e será amor para sempre. Ainda que no fim da história, a dureza dos conflitos e da falta de atenção, tragam aos olhos e à boca expressões ásperas e hostis, ainda assim; essa mágoa, se for torcida em todos os choros necessários, há de mostrar no fundo dos olhos, vermelhos e tristes, algum traço de amor.
Então, antes que acabemos por acreditar que nossos sonhos foram tolos; que acreditar na felicidade é ilusão; que a solidão é a melhor companheira; que não levamos jeito para “esse tal de amor”, tenhamos a coragem de raspar a tinta velha da superfície, e guardar com delicado carinho a imagem crua e bela do início. Tomemos a audaciosa atitude de acreditar que mesmo tendo chegado ao fim, haveremos de ser gratos e justos, porque era amor. E, se não era, quem além de nós poderá assumir a responsabilidade por um dia ter teimado em insistir que fosse?
Era amor, pode acreditar! E é ainda. Só que com outras folhas, flores, frutos e cascas. É amor, mesmo depois de não mais sê-lo. Porque tendo sido amor um dia, fez germinar dentro de nós, os nossos melhores brotos; fez de nós seres menos empedernidos e ariscos; despertou em nós o desejo de experimentar o amor de novo, e de novo, e de novo. E, mesmo que a nossa incrédula alma sofrida tenha dificuldades em concordar… Era amor, e ainda é, pode acreditar!
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