Gostar de gente nunca esteve tão fora de moda

Não é de hoje que o passado interessa mais do que o presente. Faz tempo que recordar é um jeito útil e eficiente de tocar a vida. Por algum motivo, a gente ignora o aqui e agora pra olhar de frente um canto lá atrás, um instante bonito, um velho sucesso, uma saudade boa. E vai seguindo assim, avançando de costas para o amanhã e o depois.

Claro que a gente não faz por mal. É que na falta de uma paixão novinha no presente, um motivo incomum, uma razão original que nos mantenha de pé, a gente procura e encontra no passado aquilo de que precisa para já. Está tudo lá. Todos ali, olhando em nossos olhos, à espera.

Na música, no cinema, no teatro, na moda, na TV, na poesia e em tudo quanto há, retomamos o que foi bom um dia e o fazemos funcionar de novo como velhos rádios, brinquedos antigos, fotografias em preto e branco reconstruídas em cores. No passado, reencontramos o presente perdido e seguimos adiante.

Mas em meio a tantos velhos modos revisitados, alguém bem podia inventar de novo aquele negócio antigo de uma pessoa gostar da outra. Já pensou? Do nada alguém se pega pensando: “puxa, vida… como o fulano é legal! Vou ligar pra ele!”. Num outro canto uma moça triste abre o e-mail, encontra mensagem de pessoa querida e responde animada. Ela está alegre de novo. Pais, filhos, amigos, irmãos, vizinhos, amantes ou completos desconhecidos, toda gente inventa de se tratar com ternura.

Aqui e ali, querer bem a alguém ganha ares de novidade boa. Em questão de horas, uma febre se espalha feito moda pelo planeta e de repente estamos todos, em todas as línguas, declarando amor e amizade uns aos outros.

Em vez de insultos, injúrias, maus modos e caras feias de hoje, elogios honestos, palavras de afeto e gestos gentis de ontem, reencontrados em algum lugar lá atrás e trazidos de volta para o nosso agora, retomados como modernos, clássicos obrigatórios, motivos para seguir em frente melhores, revigorados, atuais.

Aos poucos, essa coisa antiga de uma pessoa gostar da outra fará de nós uma gente nova em um mundo novo, habitado pela compreensão e a tolerância. Um mundo de gente que se ajuda, se respeita e se quer bem, avançando de frente para o amanhã e o depois.

André J. Gomes

Jornalista de formação, publicitário de ofício, professor por desafio e escritor por amor à causa.

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