Marcel Camargo

Estou aprendendo a não contar tudo o que sei e a não revelar tudo o que sinto

Não podemos negar a importância de ter alguém com quem possamos dividir nossos sentimentos mais íntimos, para que nossa carga se alivie e consigamos atravessar os problemas com apoio sincero. Porém, contar com a discrição do outro sempre será incerto, uma vez que as pessoas são imprevisíveis, muitas vezes no mau sentido. Desse modo, nunca estaremos livres de ver nossa confiança jogada fora por quem menos esperamos.

Compartilhar nossos medos é positivo, pois, muitas vezes, acabamos por dimensionar o que passamos de uma forma exagerada, visto estarmos bem no meio do redemoinho. Quando alguém nos ouve, de fora, é bem provável que a visão de quem não esteja carregado de emoção abrande os fatos, até mesmo trazendo soluções às nossas pendências. Isso nos ajuda muito.

Da mesma forma, nunca poderemos saber com clareza a reação das pessoas a quem resolvemos contar algo que sabemos. Difícil, nesse contexto, ponderarmos se vale ou não a pena revelarmos o que vimos ou ouvimos às pessoas, uma vez que as reações alheias podem nos trazer muitos problemas. Muitas pessoas preferem conviver com a mentira que conforta a ter que encarar a verdade que dói.

Quantos de nós não criamos inimizades ao contar para um amigo que ele foi traído, que disseram mentiras enquanto ele não estava presente, que ele precisa mudar algum comportamento desagradável? Infelizmente, até mesmo nossa sinceridade deve ser exercitada, porque nem todo mundo está pronto para ouvir o que não agrade, o que lhe abale a zona de conforto em que ilusoriamente se aninhou.

Por isso tudo, é preciso aprender a guardar algumas coisas somente para si mesmo. Muitas pessoas não estão querendo enxergar o óbvio, porque isso dói e requer mudanças bruscas, requer sair correndo de onde se está, requer uma coragem absurda. A verdade, portanto, não é para muitos, ou seja, compartilharmos com sabedoria e discernimento o que temos aqui dentro nos poupará de ver o nosso melhor usado da pior maneira.

Poucos serão aqueles com quem poderemos realmente contar, mas serão os poucos que trarão imensidão junto de nossa alma, fortalecendo o nosso coração e tornando-nos mais seguros na travessia das dores que virão.

Imagem de capa: Syda Productions/shutterstock

Marcel Camargo

"Escrever é como compartilhar olhares, tão vital quanto respirar". É colunista da CONTI outra desde outubro de 2015.

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