Eu não entendo. Não me desce essa gente que trata o amor e o ódio como se fossem dois lados da mesma moeda. Como se numa espécie de crise existencial – mais parecida com uma desculpa qualquer, alguém possa considerar o amor justificativa para o ódio e vice-versa.
Eu não entendo como alguém pode falar que ama os próprios filhos, mas que rapidamente se pronuncia sobre o desejo de punir com a morte os filhos de um outro alguém. Ou dessa gente que é capaz de amar da forma mais bonita um cônjuge, mas que prioriza o desejo de apagar da existência quem as decepciona ou trai.
Eu não entendo como uma parte da sociedade consegue sentir empatia pelo sofrimento daqueles atingidos por uma catástrofe qualquer e, simultaneamente, não esboçar afeto algum pelas milhares de pessoas que são brutalmente excluídas, unicamente por serem donas dos próprios destinos e cientes das escolhas afetivas ou religiosas que seguiram.
Eu não entendo o racismo. Não entendo como alguém pode querer liberdade, direitos iguais e um lugar ao sol quando tantos sofrem, descaradamente, pela cor da pele. Eu não entendo o amor dessas pessoas que dizem amar, mas que continuam propagando o ódio com vestimentas de justiça. Ou como muitos que brigam e defendem até última instância, tipos de privilégios sobrepostos aos semelhantes.
Eu não entendo como alguém pode vociferar tanto desgosto e desvios de humanidade. Porque fazer parte da humanidade não é argumento para complexos e interferências tão disformes e ríspidas.
Eu não entendo como alguém pode falar de amor e ódio no mesmo dia, semana e mês. Como alguém pode falar de paz e violência no mesmo discurso. E, para piorar, também não entendo como alguém pode falar em chegar e partir, tudo assim no mesmo coração.
O ódio transborda enquanto o amor encolhe. Eu não entendo essa gente.
Imagem de capa: O Circo (1928) – Dir. Charles Chaplin
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