Expectativas x Realidade

Por Adriana Vitória

Há três anos, uma amiga deixou a cidade grande com a família em busca de uma vida mais saudável e economicamente mais justa para criar seus filhos. Foi para o interior. Optou por uma cidade com boas escolas onde todos poderiam continuar tendo acesso à cultura e informação.

A família alugou uma bela casa em um bairro super charmoso. Os arredores eram cheios de verde e davam morada a tucanos, canários, sabiás e maritacas.

Ao longo dos anos, entretanto, a realidade mostrou-se mais forte que as expectativas e a família sentiu uma profunda disparidade de valores que ficava mais evidente em ocasiões como reuniões de escola ou até mesmo na convivência com alguns vizinhos.

A princípio eles julgaram que era só uma questão de choque cultural, mas essas diferenças eram superadas facilmente, uma vez que estavam próximos de onde vieram e podiam contar com as visitas frequentes dos amigos e com as idas à cidade que dava  continuidade as trocas afetivas que eram tão essenciais para eles, prociando o equilíbrio de que precisavam.

Um ano se passou até que, nas caminhadas que faziam com os cachorros por uma estradinha de terra, antes caminho de pasto da antiga fazenda loteada, começaram a ver a necessidade de sair com um saco de lixo recolhendo garrafas de suco, papéis de bala e picolé, latas e todo tipo de coisa que as pessoas, simplesmente jogavam pelo caminho.

Notaram ainda que, apesar da grande lixeira estar a pouco mais de 200 metros das casas do quarteirão, poucos eram os que se davam ao trabalho de ir até lá deixar os restos do dia ou da semana. O lixo, constantemente atacado por animais, continuaria se espalhando eternamente e de nada adiantaria todo este trabalho.

O tempo seguiu e os vizinhos começaram a espalhar também os restos de suas obras pela pequena estradinha que antes fora tão charmosa e as caminhadas tornaram-se desagradáveis. Ladrilhos, pregos, pedaços de arame farpado, canos e tubulações por toda parte.

Nesse meio tempo, houve tentativas de aproximar os filhos das crianças locais para que tivessem uma infância saudável de brincadeiras na rua. Não funcionou. O linguajar, não raro, lotado de palavrões e hábitos singulares acabou por separá-los.

Tudo isso começou a faze-los pensar na necessidade de uma nova mudança, mas, devido à dificuldade de se encontrar uma boa casa, resolveram procurar com calma, até que, há algumas semanas, uma vizinha próxima foi até eles aos berros e palavrões de quinta, ameaçando e reclamando das “fezes” dos cães na porta de sua casa.

Como vários cachorros, assim como vacas e cavalos, passeiam livremente a noite, isto não queria dizer que seriam cães deles. Mesmo assim, o que a vizinha chamava de “porta da sua casa” é, na verdade, um canto da estrada com pequenos arbustos adorados pelos cães. Mas não existem argumentos possíveis diante da ignorância. Ela continuou a atacá-los de maneira veemente.

Claro que, durante os anos em que viveram nessa região, a família já conheceu exceções, porém, em se tratando de Brasil, infelizmente esse tipo de comportamento vem se tornando uma regra.
Espero que encontrem um lugar melhor para viver.
Toda esta história me fez pensar. Tenho me dado conta de que, o que de fato separa as pessoas não é a religião, o gênero, orientação sexual, raça ou nacionalidade. O que separa as pessoas é a educação, ou a falta dela. O resto parece ser consequência.

A educação real nos mostra os limites de até onde podemos ir sem prejudicar quem esta ao lado. É a compaixão. Nos da o senso comum, ético e moral, e sem eles não podemos viver em sociedade. A falta dela, nos torna intolerantes, desagradáveis, mesquinhos, verdadeiros parasitas da sociedade. Um cardume nadando contra a maré, ou será a favor? Nem sei mais. Os valores andam tão equivocados que já ando meio perdida.

Partindo deste princípio, podemos encontrar o porquê de tantas discrepâncias do mundo atual, entender as guerras e os preconceitos: frutos da ignorância (ausência de informação) e da falta de educação.

O que nos diferencia dos países chamados do primeiro mundo, não é o poder econômico, mas a porcentagem de pessoas com direito à educação.

Ao contrário do que muitos pensam, a educação nos liberta e nos unifica. Quando privilegiamos a educação, respeitamos as diferenças e tiramos proveito delas para crescer e nos fortalecemos como país.

A história que acabo de narrar é triste. Ao longo da minha vida, vivi em diferentes países e, em cada um, meu nome ou condição social de origem de nada me atrapalharam. Em todos me foi dada a chance de aprender a cultura local, mostrar meus talentos, desenvolver meu trabalho com seriedade e mostrar que eu valia a pena. Dessas experiência, guardo alegrias e amigos preciosos. Pude ainda participar de movimentos importantes em prol de interesses locais, como ajudar a salvar uma árvore centenária do corte em uma pequena comunidade.

Temos que entender de uma vez por todas que não adianta lamentarmos. Quem faz um país é o povo e não meia dúzia de pessoas que porventura estejam no poder. Se vivemos no meio do lixo, é nossa responsabilidade limpar a casa.







Mineira de alma e carioca de coração, a artista plástica, escritora e designer autodidata Adriana Vitória deixou Belo Horizonte com a família aos seis meses para morar no Rio de Janeiro. Se profissionalizou em canto, línguas e organização de eventos até que saiu pelo mundo sedenta por ampliar seus horizontes. Viveu na Inglaterra, França, Portugal, Itália e Estados Unidos. Cresceu em meio à natureza, nas montanhas de Minas, Teresópolis, Visconde de Mauá, e do próprio Rio. Protetora apaixonada da Mata Atlântica e das tribos ao redor do mundo, desde a infância, buscou formas de cuidar e falar deste frágil ambiente e dos seres únicos que nele vivem.