Faça o amor viver mais. Morra de rir com quem você ama.

Sabe o que é? De repente o mundo fica sisudo demais. Carrancudo, sombrio, taciturno, macambúzio. Mergulha numa escuridão danada. Não é sem razão, não. Cada coisa que acontece! Tanta maldade que ninguém aguenta. É mau humor em todo canto. Agora mesmo as coisas andam assim. A gente entende, aceita.

Mas ainda agorinha, do nada, ouvi aqui perto alguém rindo gostoso que só. Imagine uma gargalhada incontrolável, imperiosa, irresistível. Dessas que rasgam o silêncio da noite e acendem uma coisa aqui dentro da gente. Risada franca, absoluta. E não veio de uma pessoa só. Foi risada de duas bocas, alegria de duas almas juntas. Não posso garantir, mas tenho uma quase certeza mansa que me faz bem: isso é um casal morrendo de rir juntos!

Fico aqui imaginando o que foi que fez essa gente cair assim no riso. Foi uma piada? Não pode ser. Piadas provocam um tipo previsível de reação. A gente já sabe que vem um chiste e vai ensaiando uma risada. Ela sai tranquila, estável. Não foi o caso. O que eu ouvi foi uma explosão de graça! Um estouro de alegria a dois. Nem a piada mais engraçada do mundo seria capaz de provocar esse efeito. Eu não tenho mais dúvida! Foi um casal rachando o bico um com o outro. Cúmplices, aliados, parceiros implicados numa traquinagem qualquer.

Será que assistiam juntos a uma série na TV e o protagonista foi capaz de um momento luminoso, uma frase perfeita, um gesto imprevisto, uma sacada que pegou a audiência de surpresa e quase os matou de rir?

Teria um dos dois disparado um comentário maldoso sobre um desafeto do casal e provocado a risada do outro.

Talvez o estrado da cama tenha quebrado na hora mais tórrida do amor e o orgasmo tenha sido uma descarga incomparável de gozo e riso!

Nada disso. Foi uma lembrança! Sim, uma recordação antiga e engraçada da vida em comum que mexeu com eles lá dentro, provocou associações com seus dias de hoje e arrancou de suas tripas uma risada colossal. Será que foi isso mesmo?

Talvez tenha uma terceira pessoa na cena. Um bebê que começa a fazer gracinhas, morder o próprio pé, imitar motor de carro com a boca. Quem sabe essa criança, na hora do jantar, cuspiu a comida, atirou a colherzinha longe e ela acertou a cara do cachorro que passou a lamber o focinho, desesperado com o sabor diferente, os bigodes lambuzados de papinha. Afogueado, o cão disparou a correr pela casa, bagunçou o tapete, provocou no bebê uma vontade louca de virar a papinha sobre a própria cabeça. Tudo assim, tão inesperado e tão bonito, que os pais da criança caíram na gargalhada.

Ou quem sabe seja um casal sem filhos, sem grandes perspectivas, discutindo a relação. De repente, um deles levanta mal humorado e escorrega de bunda no chão. O outro gargalha mais de nervoso que de graça. E os dois deslizam juntos numa risada enlouquecida de perder o fôlego. Até que um pergunta ao outro: “do que é que a gente falava mesmo?”, e os dois decidem fazer pipoca e assistir a um filme bobo no sofá, até dormirem cansados da lida, restabelecidos, reatados. Amantes, amados. Felizes.

Tudo isso eu imagino aqui comigo, a risada desses desconhecidos ecoando dentro de mim, fazendo feliz também este homem sozinho do sexto andar. Sabe Deus por que motivo eles riram de repente, riram com força e com graça. Por quê?

Verdade é que isso não faz a menor diferença. Mas eu torço por eles, com eles, para eles. Torço para que seja o riso de um casal que se ama, que tem problemas como qualquer pessoa mas que faz de tudo um pouco para resolvê-los. Um casal que se quer, se respeita, se ajuda, se estima. Um casal que vive bem. E que assim, do nada, de vez em quando, morre de rir juntos e faz o amor viver mais.







Jornalista de formação, publicitário de ofício, professor por desafio e escritor por amor à causa.