Por Gastão Ribeiro
“A conclusão é radical… todos em uma sociedade moderna virtualmente sofrem de traumas.”
Robert Scaer
Há alguns anos venho estudando de forma aprofundada o TEPT e seus mecanismos. Este sintoma abandonado por Freud, que no começo da psicanálise utilizava o método catártico de Breuer acreditando que usando a hipnose e acessando o trauma acabaria com os sintomas histéricos.
Com a descoberta da associação livre Freud largou a hipnose e a teoria do trauma. Assim como a hipnose o trauma caiu em esquecimento, escondido em uma falsa crença que a teoria do trauma era uma idéia ultrapassada.
Com o aumento das guerras, dos conflitos religiosos, terrorismo e violência urbana o TEPT voltou a aparecer, e com ele uma série de sintomas atuais, como ansiedade, pânico, TOC, dores, Fibromialgia, obesidade, etc.. Todos estes sintomas escondidos atrás da defesa primária do trauma, a Dissociação.
Não podemos mais fechar os olhos a esta nova forma de pensar a psicoterapia. O terapeuta, médico, clínico, profissionais de educação atuais não podem ficar alheios a estas informações e dos caminhos do trauma.
O que era um Trauma ou Transtorno de Estresse Pós-traumático
Para o DSM IV, a característica essencial do Transtorno de Estresse Pós-Traumático é o desenvolvimento de sintomas característicos após a exposição a um extremo estressor traumático, envolvendo a experiência pessoal direta de um evento real ou ameaçador que envolve morte, sério ferimento ou outra ameaça à própria integridade física; ter testemunhado um evento que envolve morte, ferimentos ou ameaça à integridade física de outra pessoa; ou o conhecimento sobre morte violenta ou inesperada, ferimento sério ou ameaça de morte ou ferimento experimentado por um membro da família ou outra pessoa em estreita associação com o indivíduo.
O que é um Trauma
Trauma em grego significa ferida. Robert Scaer em 2001 introduziu um novo conceito, o conceito de Barreiras. As pessoas a partir de suas experiências da vida passam a criar barreiras e limites de proteção e segurança. Um trauma é uma situação que rompe essas barreiras e limites que faz com que a pessoa paralise no tempo e no espaço. Excede todos os limites de segurança e suporte.
Os sintomas do Transtorno de Estresse Pos-traumático, formam um processo em espiral que acionam os mecanismos biológicos mais primitivos que faz parte da nossa herança evolutiva. A reação do organismo para sobreviver a uma ameaça, é: FUGIR, LUTAR OU CONGELAR .
Quando as respostas de fuga ou luta são impedidas, a imagem do evento fica congelada, criando uma grande confusão nas pessoas, impedido-as de ter uma vida normal.
Os sintomas traumáticos não são causados pelo acontecimento desencadeador em si mesmo. Eles vêm do resíduo congelado de energia que não foi resolvido e descarregado; esse resíduo permanece preso no sistema nervoso onde pode causar danos corporais e emocionais.
Os sintomas em longo prazo são debilitantes e frequentemente bizarros e se desenvolvem quando não podemos completar o processo de entrar, atravessar e sair da “imobilidade” ou do estado de “congelamento”.
O trauma deixa Traços Mnemônicos que são como marcas, sempre que é revivido com intensidade provoca retraumatizações. O afeto fica preso dentro das marcas, quanto mais profunda marca mais o afeto fica aprisionado.
Trauma e Dissociação
Dissociação foi um termo criado por Janet no final do século XIX para descrever um estado mental onde ocorre um rompimento de consciência. Durante a Dissociação o individuo experimenta distorções de memória, afeto, percepção ou senso de identidade. É comum ocorrer durante a Dissociação alterações de percepções, como: sensações somáticas, tempo, períodos de amnésia, irrealidade e despersonalização. Em estados clínicos mais graves ocorrem sintomas de conversão, estado de fuga e desordem de personalidade múltipla (Desordem Dissociativa de Identidade).
A Dissociação ocorre quando a ansiedade se torna tão esmagadora que certos aspectos da personalidade se tornam dissociada ou se dividem um do outro. As manifestações de dissociação servem para proteger o individuo do conflito que produz a ansiedade. A Dissociação é um mecanismo de proteção psicológica ao medo e a ansiedade.
Traumas e Sintomas Psíquicos
Um Trauma pode estar na base de algumas patologias psíquicas, e é a Dissociação a causadora destes fenômenos e sintomas psíquicos e somáticos.
Trauma e Dor
A Dissociação também pode aparecer como sintomas somáticos e dor. A dor serve para abafar a ansiedade esmagadora do trauma. Ela esta geralmente associada à parte ou região machucada do corpo, especialmente a uma das extremidades ligadas ao evento traumático sendo que anormalidades também podem aparecer na postura.
Na dor crônica causada por traumas, vemos que a postura inconsciente do paciente não reflete tão somente a dor, mas também a experiência do evento traumático que produziu a dor. Muitos desses pacientes manifestam “achados fisiológicos” que os rotulam como pacientes de dor crônica, fibromialgia por seus médicos.
Traumas e TOC
A Dissociação também pode aparecer como rituais e comportamentos obsessivos, isto é, as pessoas começam a planejar rigidamente cada hora de seu dia e fazendo uma organização metódica em suas vidas, a fim de evitar a intrusão da ansiedade do TEPT.
Traumas e TDAH
A Dissociação pode provocar uma série de problemas nas funções de processamento cognitivo e mental. A Dissociação provoca uma disfunção na atenção concentrada, as pessoas perdem a habilidade em acessar novas informações, negligenciam e ignoram detalhes importantes das informações. Os sintomas parecem com o TDAH, pois afetam a memória de curto prazo e atenção. Adultos vítimas de trauma têm sido recentemente diagnosticados como tendo DDA adulto (Distúrbio de Déficit de Atenção), mas gerados por efeitos da Dissociação.
Traumas e Pânico
Os estudos atuais de Neurofisiologia mostram que a amígdala do hipocampo tem uma função “emocional”, agem independentemente do neocórtex. Ele pressupõe que algumas reações emocionais e memórias podem ser formadas sem a participação da consciência cognitiva do neocórtex. Quando as pessoas estão sobre forte estresse elas secretam hormônios endógenos de estresse que reforçam a consolidação da memória traumática. Ele pressupõe que a secreção massiva de neuro-hormônios, no momento do trauma, desempenha um papel na potenciação das memórias traumáticas que podem reaparecer ao longo da vida.
Traumas e Pânico
E este passado, carregado de forte teor emocional, tem uma influência nas memórias impressas para controlar nosso funcionamento presente e nossas relações atuais, tornando as pessoas mal adaptáveis. Os Sintomas de TEPT aparecem ao longo da vida sob a forma de Pânico, embora a pessoas não consiga fazer nenhuma relação com a cena traumática em função da dissociação.
Traumas e Histeria de Conversão
A histeria de conversão, ou “reação de conversão” foi descrita inicialmente em detalhes por Janet e Freud. A conversão é considerada uma proteção contra níveis intoleráveis de ansiedade ou medo. A ansiedade é “convertida” em sintomas nos órgãos ou outras partes do corpo e geralmente apresentam-se como sintomas neurológicos sensoriais ou motores.
Estes sintomas representam o conflito mental, gerando ansiedade. A conversão de uma ansiedade intolerável em um sintoma físico traz grande alivio emocional, por isto as pessoas demonstram não se importar com a condição física incapacitadora. A paralisia histérica aparece de forma sistemática em soldados traumatizados por “traumas de guerra” ou “fadiga de batalha”.
A paraplegia histérica é comumente achada em vitimas de abuso sexual na infância e é uma forma de proteção contra uma exposição maior à fonte do trauma.
A reação de conversão então é um exemplo de dissociação somática em resposta a uma reação ao trauma. O paciente com reação de conversão tem um trauma no passado, que associado com um novo trauma no presente precipita o sintoma de conversão. Frequentemente os clientes com conversão tem um histórico de abuso severo na infância.
Traumas e Doenças Físicas
Muitas das doenças de causas desconhecidas que estão ligadas diretamente ao estresse traumático. As síndromes de espasmos musculares suaves/ ou ulceração do sistema gastro-intestinal estão associadas com exposição ao estresse crônico na maioria dos casos.
Um trauma pode causar cardio-espasmo no esôfago, refluxo gastroesofagal, úlcera péptica, colite ulcerativa e síndrome do intestino irritável.
A cistite está associada com úlceras dolorosas na bexiga e sintomas de desernegia motora na bexiga, também de causa desconhecida. Enxaqueca clássica é claro, é um exemplo prototípico de manifestações vasculares de desregulação cíclica autônoma e tem sido ligada a trauma do passado.
Além disso, muitas doenças crônicas têm a sua origem em um trauma. O câncer e doenças do coração estão associados às estatísticas de TEPT. O trauma é acumulativo e pode contribuir para o desenvolvimento de doenças crônicas seletivas, como também, contribuir para o progresso dessas doenças.
Fonte –
Gastão Ribeiro Apostila de Psicoterapia do Trauma – Módulo 2 – TFT e EFT – 2006.
Uri Bergmann, L.C.S.W., B.C.D. – ESPECULAÇÕES SOBRE A NEUROBIOLOGIA DO EMDR – 2001.
Servan- Schreiber – Curar – Editora Sá – 2004.
Scaer, R. (2001). The Body Bears the Burden: Trauma, Dissociation and Disease, Binghampton: – The Haworth Press, 2001.
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