“Como são admiráveis as pessoas que nós não conhecemos bem”. Tão verdadeira quanto sarcástica, a frase de Millôr Fernandes revela um fato sobre o comportamento humano: a convivência une ou separa, definitivamente, as pessoas.
Não fomos criados a partir de uma linha de produção, com gostos, inteligências, personalidades e crenças iguais. Portanto, além de sermos diferentes fisicamente, nossas diferenças intelectuais nos permitem crescer como sociedade, permitindo que a ciência e a tecnologia acompanhem esse crescimento.
Conviver é uma necessidade e um exercício diário de respeito e compreensão. Ninguém vive isolado em uma ilha, conversando com uma bola, como no filme Náufrago.
Precisamos da convivência, das conversas jogadas foras, da mesa do bar, do happy hour depois do trabalho, de risadas despretensiosas. Precisamos de pessoas de verdade, que chegam sem avisar e mudam os rumos das nossas vidas. Pessoas que sejam possibilidades de recomeços, de novas chances, de finais felizes.
A vida tenta nos ensinar coisas que, somente vivenciando-as, somos capazes de aprender. Como em um curso de graduação, onde a graduação é representada pela vida e o estágio pelas pessoas, boas ou más, que nos ensinam, na prática, que o convívio social e os interesses particulares, influenciam nossa vida mais do que podemos imaginar.
Lembro de Saramago quando afirmava que o convívio social é o responsável pela formação do caráter humano já que é, através dele, que a vida acontece e não, apenas, nos anseios individuais: “a vida, que parece uma linha reta, não o é. Construímos a nossa vida só nuns cinco por cento, o resto é feito pelos outros, porque vivemos com os outros e, às vezes, contra os outros.” (La Vanguardia, 1997)
É através da convivência que entendemos que as relações são trocas mútuas de sentimentos e que, selecionar as pessoas que entram em nossas vidas, é um respeito à própria vida e um cuidado à própria alma. Começamos a perceber que agressão verbal não é demonstração de afeto, que ciúmes não é amor e que respeito não é atitude facultativa.
Jorge Luis Borges levava isso tão a sério que dizia que “cada pessoa que passa pela nossa vida é única. Sempre “deixa um pouco de si e leva um pouco de nós”. Há os que levaram muito, mas há os que não deixaram nada. Esta é a prova evidente de que duas almas não se encontram por casualidade” (Argentina,1899-1986).
A verdade é que ninguém passa por nossa vida em vão. A diferença é que algumas pessoas são possibilidades de felicidade, outras de lições.
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