Hoje eu sonhei contigo. A luz da janela iluminava seu semblante calmo e você me sorria. Hoje eu sonhei com a sua gentileza e com o sol clareando o fogão e os ovos mexidos do café da manhã. Lá fora o tempo era de outono e dentro de mim ardia um verão azul de possibilidades.
Hoje eu sonhei com você colocando no meu prato a tua alegria e dizendo que eu devia me servir, sem culpas, dela. Hoje eu entendi que por anos não me serviram uma gentileza bonita assim, tão cheia de amor e cuidado. Hoje eu entendi o que meu coração dizia sobre buscar o amor e o cuidado.
E nesse sonho você me puxava uma cadeira e dizia, com o olhar, que meu lugar era onde a vista tocava a estonteante beleza de San Marino. E eu lembrei que eu costumava ter reservadas para mim cadeiras viradas para paredes escuras. Que eram sempre cadeiras que não davam para lugar algum. E você nesse sonho me deu sorrindo os Alpes e a Itália preguiçosa nas primeiras horas da manhã, sem pedir absolutamente nada por isso.
Eu me senti tão feliz pelo teu amor gentil que me lembrei de um livro que li no colégio no qual um menino vivia grande parte da vida enxergando o mundo embaçado e só lá no final alguém lhe dava um óculos. Você era pra mim naquele instante a clareza da vida. Eu finalmente entendia o que era ser verdadeiramente amada.
E não era preciso que você me beijasse, que me colocasse sobre a mesa e que fizéssemos amor, pois o amor se fazia naquele café da manhã, repleto de carinho. Porque o amor se fazia nos detalhes. O amor se fazia no tom suave da sua voz. O amor se fazia na mesa arrumada. Nos ovos quebrados com cuidado. Na forma bonita como você me apresentava o mundo. O amor se fazia na serenidade do teu sorriso maduro. Nesse teu sorriso de homem menino que está certo do que quer e que não finge ser o que não é.
E nesse sonho lá ao longe, pela janela de pedra, eu conseguia ver extensas plantações de girassóis com as faces tocadas pela beleza da vida. E eu como eles admirava a luz que vinha da janela contornando o seu rosto bonito.
Você, sem que eu tivesse percebido, me ensinava a delicadeza de viver, a delicadeza de amar sem obrigações, a delicadeza de aceitar o teu carinho, como um cervo judiado pelo passado, que a certa hora deixa-se acariciar pelas mãos do amor.
Você apontava-me não só a cadeira. Você apontava-me a vida e me dava ela com vista para as montanhas. Com vista para o amor.
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