Marcel Camargo

Infelizmente, muitos pais confundem dar presentes com estar presente.

Não há um dia sequer em que abrimos os jornais e não vemos alguma notícia sobre violência entre jovens. Desde tempos remotos, o conflito de gerações faz com que a juventude carregue uma aura de rebeldia e perdição, no entanto, parece que se torna cada vez mais difícil alcançar a maturidade adulta, haja vista a intolerância à frustração que é característica comum a muitas crianças, adolescentes, jovens e até mesmo supostos adultos.

Por mais razões que se enumerem como sendo motivadoras dessa onda de intolerância e de pessoas mimadas, que não aceitam o contraditório e o diferente, o que mais se destaca é a incapacidade de lidar com o que não dá certo, quando as coisas não saem do jeito que se queria. Daí se deduz que as novas gerações não estão sendo contrariadas o suficiente, durante o seu desenvolvimento emocional, ou seja, não desenvolvem a capacidade de atravessar caminhos que não querem. Fazem birra mesmo depois de grandes.

Infelizmente, hoje, a maioria dos responsáveis pelas famílias necessita trabalhar o dia todo, sobrando pouco tempo disponível para ficar com as crianças. Assim, muitos pais, como desencargo de consciência, acabam optando por uma educação mais condescendente, uma vez que se sentem mal por ficarem tanto tempo longe e não querem contrariar o filho nos poucos momentos que têm para desfrutar juntos. Além de muitos não quererem que seus filhos sofram.

Talvez seja também este um dos maiores estragos a um filho: poupá-lo do sofrimento, da dor, da frustração. Por que, afinal, não querer que nossos filhos passem pelos perrengues por que nós passamos, se foi, em muito, por causa desses obstáculos, que nos tornamos adultos responsáveis e éticos? O sofrimento vem pra todo mundo, ou seja, pais não podem evitar que seus filhos sofram, apenas conseguirão tampar o sol com a peneira – e não por muito tempo.

É preciso, ainda, que fique clara a questão do abandono dessas crianças. Abandonar um filho não é somente deixá-lo com outras pessoas. Um filho pode sentir abandono dentro de casa, quando os pais estão ali do lado. Cuidar não tem a ver com o que se compra. Presentes jamais substituirão presença, afinal, o pior tipo de solidão é aquela que sentimos quando não estamos sozinhos. Embora seja lugar comum, precisamos ter a consciência de que a qualidade do tempo que passamos junto com nossos filhos independe da quantidade de horas. Importar-se vale mais do que ficar ao lado olhando no celular.

No mais, digam não, digam não muitas vezes. As crianças precisam aprender que a vida não vai dar certo em tudo, que elas provavelmente não comprarão tudo o que quiserem, que haverá pessoas que não gostarão delas e não as amarão de volta. Não romantizem sofrimento, nem violência. O que faz mal e machuca não tem graça e não deve ser tolerado. Ensinem que as pessoas só mudam por si próprias e que, quando a gente se coloca no lugar do outro, a gente consegue entender muita coisa e ser menos injusto.

Ensinem seus filhos que a dor do outro não é brincadeira, que procurar ajuda não é feio e que psicólogo não serve só “pra gente louca”. E não esqueçam: ensinem as crianças a amar, sempre. Ensinem as crianças a amar a natureza, os animais, as pessoas. Ensinem as crianças a amarem a si mesmas. Falta amor neste mundo que adoece a cada dia. Falta amor…

***

Imagem: Pixabay

Marcel Camargo

"Escrever é como compartilhar olhares, tão vital quanto respirar". É colunista da CONTI outra desde outubro de 2015.

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