A medicação excessiva de nossos jovens e crianças

A aparente calma produzida por drogas como Ritalina e Concerta, não passam de efeito tóxico!

Precisamos parar de fechar os olhos para uma situação séria e de consequências imprevisíveis: nossas crianças estão sendo medicadas precocemente, sob o pretexto de adequá-las às demandas escolares. Inúmeros são os diagnósticos equivocados acerca de distúrbios de comportamento e dificuldades de aprendizagem. Não raras vezes, a falta de capacidade de acolher e lidar com comportamentos atípicos, leva as escolas e as famílias a interpretarem a criança como alguém que precisa ser formatado, enquadrado e encaixado.

O desrespeito às particularidades cognitivas, emocionais, sociais e familiares dos pequenos, cria uma espécie de consentimento tácito entre todos os adultos envolvidos que, mesmo sem compreender o comportamento da criança, utilizam fórmulas desgastadas, nada educativas e danosas na tentativa impor um padrão de comportamento à revelia dos processos de desenvolvimento e maturação dos recursos intelectuais e afetivos, tão necessários ao estabelecimento de relação entre a criança e as inúmeras habilidades que cabem à escola despender esforços para ajudar a desenvolver.

Com base em diagnósticos de distúrbios neurobiológicos, muitas vezes realizados sem respeitar o protocolo de avalição multidisciplinar, nossas crianças são submetidas à tratamentos por meio de drogas que agem diretamente no Sistema Nervoso Central. Medicamentos que ganharam no meio médico e educacional o sugestivo apelido de “droga da obediência”. Os mais receitados, nem sempre de forma criteriosa, são a Ritalina e o Concerta, para “tratar” crianças e adolescentes dispersos, agitados e com dificuldades de focar a atenção durante as atividades escolares.

O uso desses medicamentos no Brasil é tão banalizado que figuramos em segundo lugar na lista de consumidores da droga, perdendo apenas para os Estados Unidos. Entretanto, vem sendo cada vez mais frequente a manifestação de profissionais da área médica, psicológica e pedagógica no sentido de alertar para que se discuta com mais profundidade a real necessidade da medicação psicotrópica de crianças e jovens.

Precisamos acordar para o fato de que não se trata de uma “balinha de vitamina C”, são drogas cujas reações adversas vão de uma dor de cabeça a arritmias cardíacas e alucinações; sem falar no efeito principal chamado de “Zumbi Like”, em outras palavras, a criança fica apática, contida, agindo como zumbi. Essas reações, assim como outras, tais como hipertensão e insônia são sinais de efeito tóxico e indicam que a medicação deve ser interrompida imediatamente.

A falta de conhecimento aprofundado acerca das inúmeras variáveis que envolvem padrões de comportamento em crianças e adolescentes cria uma falsa e perigosa crença de que os mais irrequietos, agitados e com necessidades especiais para aprender, são doentes. Daí a justificativa para o uso da medicação.

É no mínimo um contrassenso categorizar como doença um comportamento agitado, num mundo em que vivemos imersos na cultura da multitarefa, dos prazeres imediatos e conquistas descartáveis. Enquanto continuarmos a medicar nossas crianças e jovens, de forma tão irresponsável, estaremos jogando no lixo inúmeras pessoas que poderiam ter suas habilidades descobertas e estimuladas. É muito comum, entre as crianças “fora de padrão” encontrarmos verdadeiros talentos para música, artes, ciências, literatura e atividades que envolvam construção e utilização de raciocínio lógico e espacial.

Os processos de aprendizagem são complexos, ricos e subjetivos. É um absurdo compactuarmos com a prática de tantas escolas que reduzem as crianças e adolescentes a meros reprodutores de conteúdos sem significado, repetitivos e descolados da realidade que nos cerca, das inúmeras questões ambientais, sociais e políticas do nosso entorno. Inverter o jogo e a responsabilidade é, para dizer o mínimo, cruel. Em vez de “drogas de obediência” tenhamos a dignidade de oferecer às crianças e jovens a nossa valiosa atenção, busquemos sair das tocas acadêmicas medievais que ainda servem às práticas educativas atuais e criemos situações de aprendizagem que favoreçam o desenvolvimento cognitivo por meio do afeto, do envolvimento e do vínculo de confiança.

Imagem de capa: stockfour/shutterstock







"Ana Macarini é Psicopedagoga e Mestre em Disfunções de Leitura e Escrita. Acredita que todas as palavras têm vida e, exatamente por isso, possuem a capacidade mágica de serem ressignificadas a partir dos olhos de quem as lê!"