Quando eu tinha 20 e poucos anos me diziam que eu poderia testar, entrar em empregos e sair, decidir o que eu gostava ou não de fazer, e que com o tempo automaticamente eu encontraria meu lugar ao sol. Os 20 se passaram, os 30 chegaram e eu continuei pulando de galho em galho. Essa semana, quando pedi demissão de mais uma empresa porque minha função não fazia sentido pra mim, fiquei surpresa ao folhear minha carteira de trabalho e ver que já não tenho mais páginas para preencher. O pior: continuo sem respostas.
De uns anos pra cá, comecei a me interessar muito por gestões inteligentes, economias colaborativas, trabalhar com algo que seja seu propósito de vida. Tudo isso faz total sentido, e cada texto/livro/palestra que leio/vejo sobre o assunto me motiva mais e mais a continuar olhando pra dentro de mim e perguntar: E ai Carol, o que você quer fazer da sua vida?
Nesse processo de eterno aprendizado pessoal e profissional, consegui eliminar lugares onde eu não quero estar e perfis para os quais eu não quero trabalhar. Hoje me conheço o suficiente para saber que não produzo para empresas nas quais eu não acredito, não vendo produtos que eu mesma não compraria, e que não trabalho em lugares com um clima organizacional péssimo. O motivo? Isso me adoece, e digo adoecer no sentido literal da palavra. Saio de reuniões para ir ao banheiro vomitar ou chego em casa e vou parar no hospital dias com as entranhas revirando por motivos que médico nenhum – nunca! – conseguiu diagnosticar.
Aprendi, então, que se não me faz bem, eu posso ir embora. Então, não só vou, como tenho ficado boa nisso. Afinal, minha carteira não se preencheu sozinha e, felizmente, ela acumula mais histórias minhas de pedido de demissão do que de empresas que optaram por me desligar porque eu não era competente ou capaz de fazer o meu trabalho.
Sempre fui perfeccionista, amo uma planilha de excel até pra fazer uma receita de bolo ou planejar um churrasco de fim de semana (#ficadica de abas importantes, aliás: convidados, o que comprar, quem traz o quê, bebidas, playlists, RSVP). Talvez por isso eu ainda sonhe com meus anos trabalhando com eventos. Aquela ausência de rotina, necessidade de ser criativa e habilidade para lidar com imprevistos faz um sorriso brotar no meu rosto só de lembrar. Que anos dourados aqueles em que pude transformar em realidade o sonho de centenas de noivas, debutantes e empresas que queriam uma festa de fim de ano que desse o que falar.
Nessa minha trajetória, minha carteira de trabalho esconde vários momentos importantes. Meus projetos paralelos ela não notifica. Meus contratos fora do Brasil ela nunca nem viu. Meu hobbie pela escrita ela nem desconfia. Férias? Acho que ela computa só uma desde 2005, ou seja, nem sinal de que viajei o mundo nessa última década. É só um documento, que mostra minhas entradas e saídas de trabalhos que a sociedade viu, aceitou, e assinou embaixo. Felizmente, sou muito mais do que está escrito naquelas páginas cheias de números.
Ser o que a sociedade espera de mim nunca me fez feliz e hoje sei que meu significado está muito mais em ser útil (e sentir-me útil) do que em receber um salário gordo que me permita tirar férias uma vez por ano e desligar o celular. Espero um trabalho que me possibilite cocriação, expressão, ação, que me dê tesão, que não me faça esperar pelas férias, que não me faça querer ir embora, que não tenha discussões sem respeito ao próximo. Difícil, eu sei.
Meu caminho talvez seja esse tal de nomadismo digital, criação de conteúdos como freelancer, consultorias por tempo determinado. Muitos comentam para eu abrir minha própria empresa, mas a ideia de criar um CNPJ no Brasil e ter um “pra sempre” de contas para pagar me faz sair correndo. Eu sempre curti essa coisa de “projetos” porque eles têm começo, meio e fim. Por isso os eventos me faziam sonhar. Um diferente do outro, exigiam um planejamento, uma criação e uma produção imensa, mas finita. O evento acabava e em minutos tudo aquilo se desmontava: era o fim de um ciclo. Eu ia pra casa, dormia e, no outro dia, tinha outro ciclo pra concluir. E eu amava isso.
Outro ponto que considero crucial: empatia. Curto a hospitalidade porque ela te permite pensar no outro e em como ele gostaria de ser tratado, e eu amo planejar uma recepção, surpreender um check-in, fazer uma surpresa num aniversário de casamento. Amo conhecer os clientes e poder proporcionar carinho e experiência. E, se der um problema, poder pedir desculpas e corrigir o trajeto antes que a impressão ruim se fixe.
Hoje o que sei é que não quero tirar outra carteira de trabalho para preenchê-la com dados que nunca me significaram nada. Tenho mais de 30 anos, e não consigo mais deixar minha própria vida passar em branco sem que eu dê o melhor de mim em todos os setores que combinam o meu ser. Também já sei que não me encaixo no modelo CLT de trabalhar na empresa com plano de carreira onde você progride anualmente no cargo e no salário e espera se aposentar como Gerente/Diretora e curtir a velhice numa casinha na praia ao lado de seu par. Meu progresso hoje depende muito mais de mim do que dos outros. A questão é: pra onde devo ir?
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