A primeira reação é sempre desconcertante, aguda, sem resposta na linguagem humana.
A morte chega e leva alguém nosso. Não do outro, mas nosso.
Por vezes ela avisa, em outras, sugere, na grande maioria, surpreende.
E encontrar uma lógica no meio de lágrimas e lembranças é de uma missão dolorosa.
Mas há lógica, há razão, há sequência, é consequência. As religiões consolam, a medicina explica, a idade muitas vezes justifica, o sofrimento anterior assina e carimba.
A morte de alguém que a gente ama é exatamente a dimensão do vazio que ela deixa.
A gente chora a nossa orfandade mais do que a partida do nosso amor.
A gente culpa a morte por esse sentimento tão incômodo, avassalador e conclusivo. Ela dita o ponto final enquanto a gente ainda está se enroscando nas reticências e exclamações.
Esta semana eu me deparei com a morte. Ela se apresentou súbita, apressada,decidida. Cumpriu sua tarefa num instante e se foi.
Num primeiro instante, a impressão foi de que ela bagunçou tudo e não ficou para ajudar a arrumar. Mas, com as emoções mais tranquilizadas, tudo ficou mais claro e, dessa forma, foi possível entender a delicadeza da partida, a sensação de missão cumprida, de tempo esgotado na esfera da vida que nós conhecemos.
Diferentemente das mortes violentas ou precoces, quando não há argumentos para justificar, a morte que chega em missão de finalizar realmente uma jornada, esta morte é quase generosa. Ela não alardeia nem confessa, mas traz alívio e descanso.
A morte há muito assume uma culpa que não lhe pertence. Ela unicamente cumpre o que lhe é imposto. E o tempo, sorrateiramente passa impune, sem chamar para si a atenção e responsabilidade. O tempo é o mandante, a morte é o executor.
E como são felizes os que podem se despedir com o imenso sentimento de que nada faltou à vida que se despede. Que o amor sempre prevaleceu e ficará eterno na forma de saudades.
Morte, eu não te culpo por me tornar mais órfã. Desta causa, eu te absolvo.