“Tem dias que a gente se sente
Como quem partiu ou morreu
A gente estancou de repente
Ou foi o mundo então que cresceu.”
Chico Buarque
Há dias e mais dias…
Há dias em que a gente questiona se é isso mesmo: se estamos vivendo bem, fazendo o certo, se estamos fazendo bem o Bem, se é assim que queremos viver.
Há dias em que a gente interroga a vida: as voltas e rodopios que ela dá.
Para que isso, por que assim, o que afinal está acontecendo?
“Viver é negócio muito perigoso”, “viver é um descuido prosseguido”, dizia Guimarães Rosa. Mesmo assim, não desistimos de querer ter voz ativa sobre a vida, sobre os acontecimentos e sobre o tempo. Tal como os amantes que mesmo discordando e brigando não abrem mão de ficarem juntos, acreditando que um dia, um mudará o outro e, aí sim, serão felizes para sempre. Essa é nossa postura frente à vida .
Há dias em que a roda-vida mostra-se uma bela dama, dá-nos liberdade de escolha, deixa-se conduzir por nossas mãos e nos seduz com seu encanto. É a mais pura paixão! Um enorme arco-íris de emoções nasce em nossos corações, e nós bailamos com leveza e graça.
Há dias em que ela parece mais preguiçosa, menos voraz em relação às horas, permitindo que respiremos devagar.
Proporciona-nos poucas novidades e, quando amantes das pequenas coisas, absorvemos tudo com mais sabor. É pura magia e diversão!
Há dias em que se mostra generosa, a cada volta que ela dá, uma surpresa boa nos espera, um presente que chega de repente, uma dádiva que nos escolhe para dar a mão.
Mas há dias em que a roda parece enlouquecida, é um verdadeiro ciclone, vira tudo de cabeça para baixo, arranca aquilo que está em desenvolvimento. Sentimos medo e atordoamento e não sabemos para onde correr. Nem sequer somos ouvidos, pouco importa nosso querer. A gente reage, “vai contra a corrente” , tranca as mãos, emperra, estanca, mas ela é soberana. É só desolação!
Nesses momentos, a roda é uma roca ceifando desejos e ilusões. O cotidiano, com seus sonhos e projetos acalentados, é mexido e remexido, não deixando pedra sobre pedra. É a roda girando e levando para longe nosso sossego e segurança.
“Na volta do barco é que sente, o quanto deixou de cumprir…”
Dias passam, outros vêm, e nós não cansamos de nos perguntar: onde erramos, o que deveríamos ter feito e que não fizemos, o que poderíamos ter evitado e que não evitamos?
“Roda mundo…”
Seu giro é impessoal e indiferente ao nosso querer.
Seus propósitos nem sempre conseguimos entender, e ela vai desenhando figuras fantásticas sempre diferentes no ar. Será moinho, será pião, roda gigante?
Capturados pela grande aventura, fascinados por sua força de atração e pelas lembranças dos momentos vividos, respiramos fundo e mergulhamos como crianças, seduzidos novamente pela velha cantiga de roda tão bela e tão louca chamada Vida.
Há um dia em que uma força mansa e tenaz nos tira da roda. A volta foi completada e é o momento de voltar para casa.
Esse passo não é ensinado a ninguém. Quem dançou com altivez e coragem todos os movimentos da roda, com certeza, saberá soltar as mãos e se deixar levar para o definitivo encontro amoroso com o seu Criador e se tornar, assim, encantado .