Em alguns momentos da vida nos tornamos invisíveis. Por motivos que não sei explicar, deixamos de ser vistos, ouvidos, de chamar qualquer tipo de atenção.
Em alguns momentos da vida, nossa face externa não reflete o que vai dentro de nosso coração, e por isso ninguém enxerga nossa luz, nossos dons e qualidades, nosso jeito único de ser e estar no mundo.
Porém, no meio de tanta indiferença, podemos ser percebidos. No meio de tanto desinteresse, podemos despertar curiosidade. No meio de tantos rostos, podemos ser “a pessoa” de alguém.
Entretanto, muitas vezes você se pergunta o que há de errado com esse alguém que se interessou por você, justamente você. De forma distorcida e sem nenhum amor-próprio, você se condiciona a achar que se alguém se interessa por você, esse alguém tem algum problema, só pode ter. Se alguém o enxerga no meio da multidão, esse alguém deve ter miopia afetiva ou é pior do que aquilo que você acha de si mesmo, isto é, um nada. Cheio de autoproteção, você sabota a própria felicidade ao decretar que esse alguém não serve para você, que seu destino é mesmo ficar sozinho. Sentencia o fim antes do fim, e depois lamenta que ninguém está a fim.
Adoro um filme chamado “Medianeras – Buenos Aires na era do amor virtual”. No longa argentino de 2011, Mariana (Pilar López de Ayala) e Martin (Javier Drolas) vivem no mesmo quarteirão, mas ainda que seus caminhos se cruzem, eles não chegam a se encontrar, passando pelos mesmos lugares sem nunca se perceberem.
Porém, tanto Mariana quanto Martin procuram alguém que os enxergue além dos muros de concreto da cidade. Em suas “solidões”, protegidos pelas paredes, eles tecem sonhos e desejos de serem vistos, de serem notados.
O filme nos leva a refletir que de vez em quando abrimos mão de conhecer melhor alguém com quem temos uma proximidade física para buscarmos a tal “proximidade perfeita” (muitas vezes ilusória) na internet.
De repente não toleramos mais erros, dificuldades, ou qualquer tipo de rasura. Buscamos um relacionamento perfeito, livre de contrariedades, sem qualquer oposição. E vagamos pelas grandes cidades sem respostas para nossos desencontros, sem soluções mágicas para nossas exigências, sem saídas para nossa invisibilidade. Assim, constatamos com pesar o quanto as relações estão frágeis, o quanto nossos desejos se distanciam do possível, o quanto podemos ser desinteressantes e descartáveis se não correspondemos às expectativas do outro.
Em alguns momentos da vida a gente tem que rever os próprios conceitos. Começar a entender que se alguém ousou te enxergar além da superfície, esse alguém é especial, assim como você é especial.
Namore a menina que lhe sorri com os olhos e o menino que lhe oferece carona embaixo do guarda-chuva num dia úmido. Namore a pessoa que é gentil, que se interessa pelos livros que você leu, que quer te contar sobre a nova série do Netflix, que não finge desinteresse para parecer interessante.
Namore a menina que curte suas postagens e o menino que comenta suas fotos. Namore a pessoa que te respeita e tem uma curiosidade genuína por tudo que se refere a você. Namore alguém que te aceita sem tirar nem pôr, e nem por isso some sem explicações para parecer sedutor.
Namore a menina que fica tímida quando te vê e o menino que te olha com ternura demorada. Namore a pessoa que presta atenção em você e se lembra do detalhe daquela sua história engraçada. Namore alguém que goste de você com a melhor das intenções, e não tenta te prender com joguinhos e punições.
Namore a pessoa que te enxergou quando ninguém mais te via porque você merece. Merece ser visto, valorizado, aceito e respeitado. Você merece aceitar um amor que diz que te ama sem achar que ele é pouco ou menor “só” porque escolheu você. Justamente você.
As pessoas desistem, descartam e se cansam muito facilmente. Valorize quem te olha, te admira, te aceita e te apoia sem exaustão, enxergando além da superfície, reconhecendo sua singularidade no meio da multidão.
E se um dia você tiver dúvidas, se lembre do tempo em que você se sentia invisível. Encontrar quem nos acolha com mansidão no meio de tanta opressão é encontrar repouso para o coração. E isso basta.
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