Marcel Camargo

Não confunda meu silêncio com solidão

Em tempos de verborragias, muitas vezes vazias e grosseiras, haja vista as redes sociais impregnadas de vozes preconceituosas, violentas e intolerantes, silenciar é tido, muitas vezes, como algo negativo, como se fôssemos obrigados a ter de gritar nossas convicções por aí, a quem quer que seja. Nesse contexto, parece que não se pode, em hipótese alguma, fazer uso do silêncio, o qual somente julgam revelar o quão solitária é a pessoa.

A cultura do status, numa sociedade em que a fama acaba se atrelando a vidas glamorosas, a fotos de corpos malhados, camarões regados a champanhe, festas em iates e noitadas nos camarotes VIPs das baladas mais chiques, realça a necessidade de sair do anonimato. Aliás, para muitos, nada pior do que ser normal, anônimo, previsível. Há que se brilhar, pois o que vale é a quantidade de seguidores e de curtidas que a pessoa recebe. Silêncio não chama curtidas.

Por isso é que se torna comum a confusão entre a quietude e a solidão, uma vez que as pessoas mais introvertidas e reservadas parecem não se encaixar nessa sociedade do espetáculo. Se a pessoa diz que não possui perfil no face ou conta no twitter, todo mundo se espanta, como se estivesse em frente a um ser de outro mundo, e logo se levantam julgamentos acerca dessa pessoa, que passa a ser tachada, por muitos, como alguém solitário, antissocial e esquisito.

Na verdade, nem todo mundo gosta de se expor, nem todo mundo tem facilidade para conversar sobre qualquer coisa com qualquer um, nem todo mundo necessita de um milhão de amigos, porque simplesmente nem todo mundo pensa igual – felizmente. Ser quieto, introvertido e comedido não significa necessariamente ser sozinho, solitário, mas pode apenas se tratar de exigência, escolha, de não se contentar com qualquer um, com qualquer coisa.

Caso não esteja nos fazendo mal ou atrapalhando a nossa vida, mantermos o silêncio poderá nos ajudar a guardar nossos tesouros, para somente compartilharmos o nosso melhor com quem realmente merecer, com quem poderemos ser verdadeiros e transparentes, sem medo, sem termos de volta, distorcidamente, o que tivermos oferecido. Solidão, ao contrário do que muitos pensam, não tem a ver com a quantidade de pessoas que conhecemos, mas com o tanto de reciprocidade que faz parte de quem está junto de nós.

Imagem de capa: coka/shutterstock

Marcel Camargo

"Escrever é como compartilhar olhares, tão vital quanto respirar". É colunista da CONTI outra desde outubro de 2015.

Recent Posts

6 frases que pessoas passivo-agressivas usam achando que é normal

No dia a dia, a maneira como nos expressamos pode afetar diretamente nossos relacionamentos interpessoais.

10 horas ago

Veterinária que doou cães de Letícia Sabatella sem consentimento faz graves acusações contra a atriz

A veterinária Adriene Firmo acusa a atriz Letícia Sabatella de negligência com seus cachorros, Bertoldo…

15 horas ago

O filme da Netflix que encantou a crítica e se tornou um dos 10 mais vistos de todos os tempos na plataforma

Este filme estrelado por Charlize Theron foi um sucesso absoluto de crítica e de público…

1 dia ago

O que diz a psicologia sobre pessoas que andam com as mãos no bolso?

Em uma sociedade onde a comunicação não verbal desempenha um papel cada vez mais importante,…

2 dias ago

Cão mais caro do mundo: híbrido de lobo e pastor caucasiano é comprado por R$ 32,6 milhões

O filhote Cadabomb Okami, resultado do cruzamento entre um lobo e um pastor caucasiano, foi…

2 dias ago

Descubra o que o ator Lázaro Ramos fez com a casa onde sua mãe foi agredida pela patroa

Em uma das passagens de seu novo livro, 'Na Nossa Pele', o ator se recorda…

3 dias ago