Denise Araújo

Não confunda sinceridade com grosseria

Esta confusão é clássica, mas não custa lembrar: sinceridade não é grosseria ou falta de educação.

É recorrente encontrarmos em todos os lugares e círculos pessoas que dizem-se assertivas, sinceras, positivas e verdadeiras. Consideram-se autênticas acima da média, proativas nas mais improváveis circunstâncias. São verborrágicas, têm um discurso de palmatória do mundo, são geralmente moralistas, quase sempre estão certas enquanto todos à volta estão equivocados, são exemplos de idoneidade e de comportamento.

Costumeiramente cometem equívocos pela pressa em classificar os outros. Sim, elas adoram classificações, mas quase sempre enfatizam as más características, pois para elas são raras as pessoas virtuosas no mundo. Sentem prazer em apontar dedos. Suas palavras quase sempre ferem os outros. São inconvenientes. Com o tempo, os amigos vão se afastando e os familiares vão deixando de fazer contato. Entretanto, a culpa é de todos, claro.

Conversar com elas costuma ser angustiante, pois dá a impressão de que estão sempre brigando e procurando motivos para discordar. Perdem a paciência com facilidade, xingam com a mesma tranquilidade com que dão “Boa tarde”, estão sempre exasperadas e ofendem sem perceber até aqueles que elas mais amam. Amam e odeiam no mesmo segundo. Infringem as regras sociais de acordo com a conveniência. Em casos extremos, estão a brigar e a hostilizar sem reservas de locais ou de situações, não importando se estão em lugares públicos ou inapropriados para brios tão elevados. Ah – e não raro – falam alto, aos berros mesmo.

Acham uma gracinha a facilidade com que vão do “Por gentileza” até o “Vá se danar”, pois consideram isso uma virtude exclusiva de pessoas extremamente sinceras, que não escondem os sentimentos. Estão desatentas com o que verdadeiramente acontece ao redor. Escutam cinco minutos de conversa e já tomam partido de alguém ou criam verdades inquestionáveis na cabeça. Desconfiadas, têm certa dificuldade para acreditar em boas intenções ou bondade gratuita. Ninguém é inocente até que prove-se o contrário para elas.

Têm opiniões bem formadas sobre tudo e não encaram com naturalidade os pontos de discordância. Qualquer ocasião é momento para demonstrar a impressionante inteligência que adquiriram. Despejam inúmeros assuntos diferentes na mesma frase. Atrapalham-se todas. Trocam nomes, confundem datas e estatísticas, enganam-se sobre fatos, entretanto mostrar que elas estão equivocadas, mesmo que educadamente, é péssima ideia. Embora considerem-se civilizadas, contra-argumentar logicamente e com calma não é o forte delas. Melhor mesmo é “vencer” as discussões nas ofensas e sem esses mimimis todos de reflexões ou de critérios. Pensar é um desperdício. Demorar em conversas é coisa de vagabundo, de gente desocupada. Elas, porém, são árduas trabalhadoras e sentem-se uma exceção por tal.

Rapidamente mudam de opinião em relação a alguém. Seus afetos acabam por fragilizar-se em meio a um turbilhão de rudezas que, sem querer, passou a reinar em suas personalidades. Você pode ser um amigo querido e daqui a cinco minutos ser o pior do ser humano. São passionais e por besteiras são capazes de ficar meses ou anos sem falar com amigos, pais, irmãos ou até filhos. Ninguém, absolutamente ninguém escapa da insanidade.

Bem, algumas delas não são nada do que propagam. Nada de verdadeiras demais, honestas acima da maioria, assertivas ou prenunciadoras da verdade. São só mal educadas ou grosseiras mesmo. É sempre bom ter reservas com pessoas que fazem autopromoções alardiosas. Quem busca ser uma pessoa boa quer isso na essência. A percepção exterior é límpida consequência.

É difícil refletir-se em um perfil assim, imagino, mas em caso de identificação o caminho mais sábio não é a conhecida revolta. Autoconhecimento e autocrítica sim. Primeiro perceber-se, e depois tentar mudar a rota tão sedutora e perigosa da irracionalidade. Precisamos honrar a fama de Homo Sapiens, fazer valer. O mundo agradece quando optamos pelo caminho da evolução, ainda que continuemos eternamente erráticos, humanos que somos. Buscar extrair algo de verdadeiramente benévolo na curta existência de que dispomos.

Imagem de capa: Reprodução

Denise Araujo

Sou Denise Araujo e não tenho o hábito de me descrever. Não sei se sei fazer isso, mas posso tentar: mais um ser no mundo, encantada pelas artes, apaixonada pelos animais, sonhadora diuturna, romântica incorrigível, um tanto sensível, um tanto afetuosa, um tanto criança ...

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