“Eu devia fazer isso”. “Eu devia fazer aquilo”. “Preciso parar de pensar nisso”. “Preciso parar de lembrar daquilo”. “Não quero mais pensar nisso”. “Durmo e acordo pensando nisso”. “Preciso encontrar uma forma de resolver isso e quanto mais eu penso menos encontro a solução”.
“Por que, simplesmente por que, não consigo parar de pensar nisso”?
Simples: porque sua mente está tentando proteger você.
Toda neurose, toda ideia obsessiva, é um mecanismo de proteção.
Nos apegamos a dramas, dores e problemas corriqueiros para não fazermos contato com o que mais tememos, com emoções e situações que nos parecem ameaçadoras.
É natural ficarmos tristes após o rompimento de uma relação. É natural nos preocuparmos com a nossa saúde. É natural temermos perder o emprego em tempos de crise, assim como é natural temer a perda de um ente querido.
No entanto, quando permitimos que esses receios tomem conta do nosso dia e se repitam a cada pausa que fazemos para o café, durante o banho, durante as refeições, no trânsito – fazendo com que nossas noites sejam mal dormidas – nos tornamos reféns de nossas ideias obsessivas.
Existe um ditado popular que diz: “Se não consegue superar um problema, ao menos deixe de falar sobre ele”.
O psicanalista Contardo Calligaris escreveu sobre este assunto no artigo “Palavras de amor”:
“Os sentimentos funcionam como picadas de mosquito, que coçamos e recoçamos até que se tornem feridas infectadas e, às vezes, septicemias generalizadas (quem sabe fatais). Salvo um exercício difícil de autocontrole, qualquer picada pode adquirir uma relevância desmedida: a gente tende a se coçar muito além da conta porque descobre que se coçar não é um alívio, mas um prazer autônomo em si. (…) Basta se calar um pouco, assim como é suficiente não se coçar para que as picadas de mosquito parem de incomodar”.
Lembrando que sentimentos podem se tornar pensamentos e pensamentos podem se tornar palavras ou ações como, por exemplo, escolher ouvir todos os dias aquela maldita música de cortar os pulsos somente para coçar a ferida de algum abandono.
Mas nós não procuramos sarnas para nos coçar porque queremos e sim porque ao nos distrair com a coceira, deixamos de pensar no que realmente nos angustia.
É muito melhor sofrer por um amor perdido, por exemplo, do que pela sensação incômoda de não estar conseguindo atingir os próprios objetivos e sonhos traçados. A dor de amor é conhecida, todos nós já a experimentamos e, por mais que estejamos no fundo do poço, sabemos que ela passa. Já encarar o medo do fracasso nos olhos e ser obrigado a assumir a responsabilidade pelo caos que está a nossa vida, aí são outros quinhentos.
Quanto mais uma ideia se torna repetitiva, obsessiva, quanto mais você pensa sobre um determinado assunto, mais isso quer dizer que você está fugindo de algo maior e que teme não ter estrutura para lidar com determinada realidade.
Os pensamentos obsessivos tendem a nos paralisar, pois em geral são filhos do medo – de ser abandonado, de fracassar, de ser rejeitado, de não dar conta, de não ser aceito, de não merecer, de perder – e não existe nada mais paralisante nessa vida do que o medo.
Tais pensamentos podem até nos proteger num primeiro momento, mas depois se tornam um transtorno, um estorvo, nos impedindo de progredir, crescer, evoluir, conquistar, realizar.
Que tal parar para pensar nas sarnas que você anda coçando? O que você perderia, de fato, se abrisse mão dessa coceira?
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