Não espere conhecer a dor da perda para aprender o privilégio de ter

A gente não tem somente o que se vê, o que se compra, o que se acumula materialmente. A gente junta muita coisa aqui dentro, em nossa carga afetiva: momentos, lembranças, músicas, sorrisos, bem como o que espalhamos por aí.

Soa a clichê, a conversa de botequim, mas valorizar o que possuímos, enquanto ainda o temos, parece ser algo não tão comum. Infelizmente, temos a mania de ficar pensando e lamentando acerca de coisas que não obtivemos e pessoas que não ficaram junto de nós. Enquanto isso, perdemos tempo e gastamos energia com o que não é, deixando de lado o que já é, deixando de aproveitar cada conquista que galgamos, cada pessoa que se mantém ao nosso lado com verdade.

E a gente não tem somente o que se vê, o que se compra, o que se acumula materialmente. A gente junta muita coisa aqui dentro, em nossa carga afetiva: momentos, lembranças, músicas, sorrisos, bem como o que espalhamos por aí. Sim, tudo o que sai de nós na forma de amor se multiplica em nossos corações. É preciso valorizar como nos sentimos e a forma como fizemos os outros se sentirem também. Isso ninguém nos tira.

Se pararmos, mesmo que por alguns instantes, e olharmos à nossa volta e dentro de nós, poderemos perceber o quanto já somos afortunados, o tanto de conquistas e de presentes que a vida nos tem trazido. Aquele amigo que nos ouve, aquele irmão que nos entende, o banho quentinho, o lar que aconchega, o alimento que sustenta, a cama que nos renova. Não teremos tudo o que queremos, mas teremos muita coisa e pessoas que nos bastam, que nos completam, que nos revigoram.

Logicamente, querer mais, de uma forma ética e coerente, nunca será ruim, porque é assim que alimentamos os nossos sonhos, é assim que planejamos o nosso futuro, é assim que a felicidade se torna a cada dia mais próxima. No entanto, jamais poderemos focar tão somente o que ainda são hipóteses, o que ainda é distância e quimera, ou não conseguiremos tranquilizar a nossa essência, junto ao que já faz parte de nossas vidas. Isso nos tornaria incapazes de sorrir com sinceridade.

Muito se fala em gratidão, em agradecer, e é isso mesmo. Quando nos sentimos gratos, nós nos abrimos para tudo de bom que existe vindo em nossa direção, expandindo nossas ações a mais pessoas, ajudando, confortando, fazendo com que o bem alcance o maior número de indivíduos. O ódio fica na gente, mas o amor se espalha e continua se multiplicando, lá fora e dentro de nós. Não deixe para se lembrar dos privilégios lá na frente; desfrute-os aqui e agora, enquanto é tempo. Tempo é já.

Imagem de capa: Olena Andreychuk/shutterstock







"Escrever é como compartilhar olhares, tão vital quanto respirar". É colunista da CONTI outra desde outubro de 2015.